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segunda-feira, 30 setembro, 2024
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Segredos históricos: Os 200 anos da primeira Constituição brasileira e as verdades ocultas

Por Marina B.

Uma Constituição elaborada por decreto? Sim, mas não sem ser referendada, submetida ao escrutínio das paróquias; um feito que nenhuma outra constituição brasileira havia alcançado. Foi inovadora na divisão de poderes e nos avanços dos direitos fundamentais, garantindo, entre muitos outros, o direito à propriedade, à independência judicial, à liberdade de expressão, imprensa, opinião, locomoção, defesa, devido processo legal e, surpreendentemente, o direito de eleger e destituir representantes.

Além disso, definiu quem seria considerado cidadão, não súdito, como frequentemente erroneamente sugerido por alguns historiadores.

Em 25 de março, comemoramos os 200 anos da primeira constituição do Brasil, datada de 1824. Um breve retrospecto evidencia que esta constituição, que estabeleceu as bases do Brasil como nação, é motivo de orgulho para todos os brasileiros.

Defensor perpétuo da pátria: Nos meses que precederam o grito do Ipiranga, Dom Pedro I desafiou as ordens das cortes portuguesas e optou por permanecer no Brasil. Esse foi o Dia do Fico, um primeiro ato de desobediência. Os ministros brasileiros liderados por José Bonifácio decidiram então proclamar Dom Pedro como mais do que um regente, para enfrentar as ameaças vindas de Portugal. Assim, ele recebeu o título de Defensor Perpétuo do Brasil. Talvez o título mais nobre já conferido em nossa história, e que não foi dado a nenhum outro brasileiro além de seu próprio filho, Pedro II.

A independência: Ao proclamar a independência, Dom Pedro I rompeu não só com a ideia de um Reino Unido de Brasil, Portugal e Algarves, mas também com a constituição portuguesa, que lhe garantia autoridade no Brasil. Nos dois anos seguintes, ele dependia dos brasileiros que, felizmente para ele e para o Brasil, o aclamaram como imperador. Por quê “felizmente”? Porque Pedro era um defensor da constituição por convicção e logo convocou uma assembleia constituinte, mesmo antes de obter o reconhecimento internacional de nossa independência.

Pedro sabia que a governabilidade, a estabilidade e até mesmo o reconhecimento internacional do Brasil independente só viriam com a estruturação de um Estado moderno. Ao contrário de seu irmão, Dom Miguel, que era absolutista convicto e resistiu às tentativas de estabelecer novas constituições para Portugal, Pedro desejava a transição do modelo tradicional para o modelo liberal, e estava disposto a lutar contra seu irmão por isso.

Convocação da Constituinte: Antes mesmo da independência do Brasil ser proclamada, já se planejava a estrutura política que incluiria uma carta magna nacional. A sociedade da época, representada por várias entidades civis e religiosas, organizou-se contra as Cortes Portuguesas, que pretendiam centralizar as decisões comerciais e administrativas em Portugal, o que representaria um grande retrocesso para o Brasil.

“A solução estava clara: era a convocação de uma Constituinte Brasileira. A iniciativa partiu das lojas maçônicas, verdadeiros clubes políticos que ainda não tinham uma assembleia sob seu controle e influência”.

Essa passagem, de autoria do historiador do século 19, Manuel de Oliveira Lima, destaca o marco histórico, com a assembleia convocada apenas um ano após a independência do Brasil. É importante destacar que o reconhecimento do Brasil como país independente pela comunidade internacional só ocorreu em 1824, e por Portugal em 1825, após a consolidação da nova carta constitucional.

Com a unidade nacional assegurada e a independência em processo de consolidação, uma vez que mesmo um ano após a proclamação, algumas províncias relutavam em aderir ao império, Dom Pedro I convocou seu conselho de ministros e decidiu convocar uma constituinte. José Bonifácio esperava a formação de um conselho de procuradores antes da assembleia constituinte, mas Dom Pedro I substituiu o conselho de procuradores, estabelecido em 1822 antes da independência, por um conselho de Estado que definiria as bases da nova Constituição, abrindo caminho para a convocação de uma assembleia constituinte.

A verdadeira razão do fechamento da constituinte: A Assembleia Constituinte foi aberta em 3 de maio de 1823 e dissolvida em 12 de novembro do mesmo ano, um evento que alimentou diversas narrativas históricas equivocadas. Na verdade, os constituintes estavam interessados em remover quase todos os poderes do imperador, entrando em conflito com seu desejo de manter o Poder Executivo. No entanto, o verdadeiro motivo para o fechamento foi mais sério: Dom Pedro I e seu gabinete, formado em julho do mesmo ano, buscavam a reconciliação com os portugueses no Brasil e em Portugal, já que Portugal ainda não havia reconhecido a independência do Brasil. No entanto, os constituintes, ávidos por retaliação, introduziram termos radicais em vários artigos da nova carta, como a perseguição e o banimento dos portugueses do país, o que inevitavelmente resultaria em guerra.

A dicotomia era evidente: de um lado, uma assembleia constituinte inspirada na Revolução Francesa, inclinada a redigir a carta para satisfazer grupos rebeldes locais; de outro, o desejo de um estadista em estabelecer as bases legais da nova nação e obter reconhecimento e legitimidade internacional.

O imperador prevaleceu e, ao contrário do que afirmam as narrativas equivocadas, a Constituição de 1824 prevaleceu. Sim, a constituição prevaleceu, pois após o fechamento da constituinte, o trabalho foi retomado pelos conselheiros do imperador. Uma vez concluído o texto, cópias foram enviadas às paróquias de todo o Brasil para aprovação. Todas responderam positivamente, e somente então Dom Pedro outorgou a nova carta constitucional em 25 de março de 1824.

A omissão conveniente desse referendo pelas paróquias por “historiadores” é um detalhe significativo, pois as comunidades locais eram administradas pelas paróquias da Igreja Católica, o que acrescenta uma dimensão prática à inclusão da igreja na constituição.

Poder moderador e parlamentarismo: O poder moderador representou uma evolução do modelo proposto por Montesquieu em sua obra “O Espírito das Leis”. Neste texto, Montesquieu defendeu um monarca esclarecido que compartilharia o poder executivo com os poderes legislativo e judiciário.

No entanto, logo após a Revolução Francesa, surgiu na França o político Benjamin Constant (não a ser confundido com o republicano brasileiro do século 19), que propôs uma separação ainda maior entre o monarca e o poder executivo. Ele argumentou a favor de um presidente do Conselho de Ministros exercendo o poder executivo, enquanto o monarca ficaria com o papel de moderador, intervindo apenas se os três poderes (executivo, legislativo e judiciário) entrassem em conflito. Essa inovação foi incorporada à Constituição de 1824 e foi fundamental para estabilizar o jogo político ao longo de sua vigência.

Vinte e três anos mais tarde, em 1847, Pedro II emitiu o Decreto Imperial, transferindo formalmente as funções do poder executivo para o presidente do Conselho de Ministros, efetivamente estabelecendo o parlamentarismo no país. No entanto, este evento é frequentemente ignorado por “historiadores”, pois contradiz a narrativa de que o poder moderador era intrinsecamente ditatorial.

Estes são apenas alguns dos temas complexos que merecem uma análise mais aprofundada, talvez em um livro que contextualize o século 19. O que vocês acham?

Enquanto isso, este modesto texto oferece uma lembrança da obra constitucional de 1824, que refletiu os ideais virtuosos da época, elaborada por verdadeiros patriotas e que estabeleceu o Brasil como um exemplo institucional nas Américas. Convido-os a conhecer o texto completo da Constituição de 1824.

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