A crise entre o governo e o Congresso sobre as emendas parlamentares acabou com um típico “acordão”, mediado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O pacto promete aumentar a transparência nas indicações orçamentárias de deputados e senadores para seus redutos eleitorais, mas não resolve a questão do controle do Orçamento pelo Executivo.
As chamadas “emendas Pix” foram mantidas, permitindo a transferência de recursos da União para prefeituras e governos estaduais. O Congresso comprometeu-se a definir mínimas diretrizes sobre como esses recursos devem ser utilizados, priorizando obras inacabadas, mas isso não garante uma aplicação eficiente.
O problema fundamental das transferências especiais persiste. Apesar de serem uma prática desde 2019, as “emendas Pix” sempre foram consideradas inconstitucionais pela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Elas violam o pacto federativo, a separação dos Poderes e direitos individuais, e sua manutenção enfraquece a função do STF em defender a Constituição.
O acordo também não aborda o caráter impositivo das emendas. As emendas individuais só serão não executadas em caso de impedimento técnico, enquanto as emendas de bancada só poderão ser direcionadas a “projetos estruturantes”, sem definição clara.
As emendas de comissão, semelhantes às antigas emendas de relator e as únicas sem caráter obrigatório, foram preservadas. Elas deverão priorizar projetos de “interesse nacional ou regional”, definidos entre governo e Congresso, mas o problema da falta de identificação do autor da indicação permanece.
O pacto não alterou o volume das emendas no Orçamento, que gira em torno de R$ 50 bilhões. Com a Emenda Constitucional da Transição, as emendas individuais representam 2% da Receita Corrente Líquida e as de bancada 1%. Elas não poderão ultrapassar 2,5% do arcabouço fiscal, mas também não serão reduzidas.
O pagamento das emendas continuará suspenso pelo STF até que o acordo seja regulamentado, o que parece diminuir a força do Legislativo. No entanto, a regulamentação, prevista para os próximos dez dias, será rigidamente controlada pela cúpula do Congresso.
Para o governo, a situação melhorou um pouco. Se não conseguiu convencer os parlamentares a utilizar as emendas para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), talvez agora consiga obter parte dos recursos para seus projetos prioritários.
A capacidade do Legislativo de proteger seus interesses não deve ser subestimada. Detalhes nas emendas constitucionais, leis e resoluções podem facilmente obscurecer a diferença entre teoria e prática.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, afirmou que se chegou ao “consenso possível”, um entendimento que evidencia uma Corte mais preocupada em mediar crises do que em proteger a Constituição. O acordo reflete a continuidade da disfuncionalidade, com o Supremo buscando apaziguar os ânimos em vez de exigir o cumprimento de decisões judiciais.
O descontentamento demonstrado por Arthur Lira (PP-AL) pode parecer encenação, enquanto o STF celebra sua atuação e o governo comemora prematuramente. Como observou o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), a crise resultou em um pequeno avanço, e a relação entre os Poderes e as emendas parlamentares provavelmente continuará a mesma.