Após a assinatura dos acordos coletivos de maio, os entraves promovidos pelos sindicatos para contestar a contribuição assistencial voltaram a chamar a atenção. Esta taxa, conforme prevista pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), requer aprovação em assembleia para subsidiar as negociações coletivas das entidades.
Desde setembro, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) validou a cobrança da taxa de todos os trabalhadores, incluindo os não sindicalizados, têm surgido queixas sobre exigências que dificultam ou impedem o exercício do direito de oposição ao recolhimento.
Entre os dias 15 e 24 de maio, trabalhadores não afiliados ao Sindicato dos Empregados no Comércio de Curitiba e Região Metropolitana (Sindicom) enfrentaram filas extensas no centro de Curitiba para contestar os descontos em seus salários. Alguns relataram esperas de até quatro horas para entregar uma carta de oposição por escrito.
Ao ser questionado sobre a magnitude das filas, o presidente do sindicato acusou os empregadores de pressionar os funcionários a se opor à cobrança. Ariosvaldo Rocha afirmou à rádio local Banda B que “o sindicato está com dez pessoas recebendo e homologando essas cartas de oposição, mas está havendo a ingerência de alguns patrões para se opor aos direitos. As empresas estão incentivando a oposição e vamos denunciar isso ao Ministério Público do Trabalho”.
Em São Paulo, trabalhadores representados pelo SINTRACONSP, sindicato dos trabalhadores da construção civil com mais de 400 mil trabalhadores em sua área de atuação, reclamaram do curto prazo de apenas 10 dias após a assinatura da convenção coletiva para manifestar sua oposição. Além disso, alguns tiveram que visitar o sindicato mais de uma vez para entregar cartas escritas à mão.
“É importante ressaltar que a conhecida dificuldade ortográfica da maioria dos trabalhadores da construção civil muitas vezes os faz desistir do direito de oposição”, observou um gestor de Recursos Humanos de uma empresa local que denunciou o caso à Gazeta do Povo. “Na primeira tentativa, um grupo de trabalhadores teve que retornar à empresa, que estava exigindo que a contestação fosse feita em duas vias. Eles tiveram que, com dificuldade, redigir novamente a carta”.
Empresas enfrentam limitações para intervir
O gestor de RH também destacou a proibição da empresa de apoiar a recusa da cobrança, conforme estabelecido em cláusula do acordo coletivo que classifica essa iniciativa como prática antissindical.
O parágrafo quinto do documento proíbe “às empresas realizar quaisquer manifestações, atos, campanhas ou condutas similares (como: envio de cartas de oposição em lote, disponibilizar transporte para envio em massa de trabalhadores, exigir a apresentação de carta de oposição ao sindicato sob ameaça, enviar mensagens aos trabalhadores ou grupos de trabalhadores divulgando formas de oposição, enviar e-mails na intranet da empresa divulgando formas de oposição, disponibilizar modelo de oposição para cópia e incentivar o direito de oposição), com o objetivo de encorajar ou instigar trabalhadores não filiados e/ou filiados ao sindicato a exercerem seu direito de oposição por escrito”.
“É abusivo forçar os funcionários a irem ao sindicato. Algumas pessoas atravessam a cidade para esperar uma hora e meia na fila. A contribuição é ainda mensal, de R$ 45. Um valor considerável. O prazo, além de curto, é completamente inaceitável e viola a liberdade de escolha e associação livre”, declarou o gestor.
Em comunicado, o SINTRACONSP afirmou que não houve “qualquer ocorrência desse tipo” nem qualquer reclamação de empresas ou trabalhadores. “É importante notar que esta entidade assinou a Convenção Coletiva com o SINDUSCONSP em 13/05/2024, e no texto da norma coletiva foram estabelecidas várias formas de entrega da carta de oposição ao desconto da contribuição assistencial, incluindo: pessoalmente, por carta registrada com aviso de recebimento e também por e-mail, ou seja, diversas opções para a entrega da referida oposição”.
Empresas podem negociar cláusulas adequadas
Segundo a advogada trabalhista Danielle Blanchett, do escritório Rocha Pombo, Andrade e Capetti, a prática de dificultar a oposição é comum, e a situação da empresa é delicada.
“O empregador fica de mãos atadas, pois não pode interferir na relação entre empregado e sindicato profissional, sob pena de conduta antissindical, e também está obrigado a cumprir a CCT, uma vez que o sindicato patronal, representante de sua categoria, concordou com seus termos”, disse ela. “Contudo, é ele quem acaba ‘pagando a conta’, pois o empregado geralmente discute essas questões relacionadas a descontos em ações trabalhistas movidas contra o empregador, mesmo que o beneficiário dos descontos seja o sindicato, especialmente pela falta de meios claros para uma discussão apropriada sobre o assunto com a própria entidade”.
Renato Franco, advogado patronal e professor da Fundação D. Cabral, acredita que as empresas devem se comprometer com o sindicato e evitar que os gestores incentivem a oposição. “A empresa não deve opinar, facilitar ou disponibilizar transporte, liderar pessoas para fazer oposição. A autonomia sindical deve ser respeitada. Por outro lado, os gestores podem dialogar para evitar a cobrança de contribuições abusivas ou cláusulas que restrinjam o direito de oposição dos trabalhadores. Isso faz parte de um bom trabalho de relações trabalhistas”, disse.
TST pode regulamentar o direito de oposição
A decisão do Supremo de aprovar a cobrança de todos os trabalhadores foi uma resposta à necessidade de financiamento dos sindicatos, que enfrentam dificuldades financeiras desde o fim do Imposto Sindical, em 2017.
Embora o STF tenha garantido o direito de oposição à cobrança para os trabalhadores não sindicalizados, não regulamentou os meios pelos quais o empregado pode contestar exigências abusivas.
Para suprir essa lacuna, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) está avaliando um mecanismo para definir o modo, o momento e o local apropriado para os trabalhadores não sindicalizados exercerem seu direito de oposição ao pagamento. Em março, o colegiado acolheu a proposta de instaurar um incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), instrumento que garante um entendimento uniforme sobre uma mesma questão de direito.
Inicialmente, essa decisão pode ajudar a esclarecer os limites das exigências. “É uma maneira de tornar as regras mais claras para empresas, sindicatos e trabalhadores”, afirma Antônio Galvão Peres, professor de Direito do Trabalho da Escola Brasileira de Direito (Ebradi).
No entanto, Danielle Blanchet acredita que isso não encerrará a controvérsia, pois não há consenso jurídico sobre se o TST pode definir tais critérios. Alguns argumentam que, sem legislação específica sobre o assunto, a determinação dos parâmetros está dentro dos limites da negociação coletiva.
“É provável que a discussão sobre o assunto continue por um bom tempo em ações individuais e coletivas, mesmo após uma decisão do TST, cabendo aos advogados e às partes demonstrar, caso a caso, que os parâmetros de oposição estabelecidos em uma determinada norma coletiva realmente impedem o exercício desse direito”, afirma Blanchet.