Deputado do PL invoca imunidade parlamentar e ignora intimação do Supremo sobre declarações sobre controle de emendas; tensão entre Legislativo e Judiciário se intensifica
O líder do Partido Liberal (PL) na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcante (RJ), elevou o tom contra o Supremo Tribunal Federal ao se recusar a prestar esclarecimentos solicitados pelo ministro Flávio Dino.
Em resposta protocolada nesta terça-feira (29), o deputado alegou imunidade parlamentar e afirmou categoricamente que não deve explicações ao Judiciário por declarações feitas à imprensa sobre acordos internos de distribuição de emendas de comissão.
“Na qualidade de Deputado Federal e líder do Partido Liberal – PL, amparado no disposto no art. 53 da Constituição Federal, consigno que fico eximido de apresentar quaisquer explicações sobre o conteúdo da referida entrevista, concedida exclusivamente no âmbito do exercício do mandato parlamentar”, escreveu Sóstenes, amparado na Constituição Federal, que garante inviolabilidade a deputados e senadores por opiniões, palavras e votos relacionados ao exercício do mandato.
O parlamentar citou ainda jurisprudência do próprio STF para reforçar seu direito de se manifestar publicamente sem ser compelido a responder judicialmente.
Conflito com o Supremo
O embate foi iniciado após Flávio Dino intimar o deputado a prestar esclarecimentos em 48 horas, na esteira de uma entrevista em que Sóstenes sugeriu romper acordos internos da Câmara para assumir o controle integral das emendas parlamentares nas comissões presididas pelo PL. Dino avaliou que, se confirmadas, tais declarações poderiam violar os princípios da transparência previstos na Lei Complementar nº 210/2024.
A acusação é grave: o ministro sugeriu que haveria risco de uso político dos recursos públicos destinados a emendas parlamentares, que movimentam bilhões de reais em obras e projetos nos Estados.
Em resposta, Sóstenes negou qualquer intenção de romper acordos com o STF e reafirmou que todas as verbas seriam geridas com total transparência.
Choque entre poderes
A recusa de Sóstenes em atender à solicitação do Supremo representa mais do que um gesto isolado: é um sinal claro do crescente atrito entre Legislativo e Judiciário. O episódio levanta questionamentos sobre a atuação do STF em temas que envolvem o funcionamento interno do Congresso Nacional e a independência entre os poderes.
A declaração do deputado à imprensa — de que o PL poderia passar a controlar 100% das emendas nas comissões de Saúde, Agricultura e Turismo — foi interpretada por Dino como uma possível ameaça à governança orçamentária. Sóstenes, porém, diz tratar-se apenas de um recurso político legítimo dentro das regras da Casa.
Bastidores e reação política
O pano de fundo da crise é o adiamento da votação da urgência do projeto de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro, determinada pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Segundo Sóstenes, o acordo interno previa que 30% das emendas ficariam com o partido que preside a comissão, e os outros 70% seriam distribuídos por Motta. Com o novo impasse, o PL cogita reter integralmente os recursos em suas mãos.
“O que comunicamos ao ministro Flávio Dino será mantido, mas por nós — e não mais pelo presidente da Casa”, disse o deputado em entrevista à GloboNews.
Crítica velada ao ativismo judicial
Ao invocar a Constituição e jurisprudência do próprio STF, Sóstenes lança uma crítica implícita àquilo que muitos no Congresso consideram ativismo judicial. A recusa em atender Dino é também uma forma de afirmar a autonomia do Parlamento em um momento de crescente judicialização da política.
O episódio amplia o clima de tensão entre os poderes e reacende o debate sobre os limites da atuação dos ministros do Supremo em assuntos internos do Legislativo.