Stefanutto ocupou postos estratégicos mesmo sob suspeita de receber propina
O ex-presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, preso pela Polícia Federal (PF) na quinta-feira, 13, exerceu papel central na transição governamental da Previdência Social após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2022. As informações foram divulgadas pelo O Globo nesta segunda-feira, 17.
Stefanutto comandou o grupo técnico da Previdência, um dos 33 núcleos criados para preparar o novo governo, apesar de já ser investigado por suspeitas de corrupção. De acordo com a PF, ele recebia propina da Confederação Nacional dos Agricultores Familiares (Conafer) enquanto participava dos trabalhos da transição.
Investigações apontam pagamentos mensais para manter esquema
Segundo os investigadores, Stefanutto recebia da Conafer entre R$ 50 mil e R$ 100 mil por mês em troca de favorecimento em processos internos do INSS, especialmente nos Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) — mecanismo que permitia aplicar descontos associativos diretamente nos benefícios de aposentados. O uso desses ACTs é apontado como sustentação do esquema de fraudes que desviou centenas de milhões de reais.
A Conafer assinou seu ACT em 2017, período em que Stefanutto atuava como procurador-geral do INSS. Após a eleição de Lula, ele retornou ao órgão como diretor de Orçamento e Logística e, três meses depois, assumiu a presidência do instituto por indicação do ministro da Previdência, Carlos Lupi.
Stefanutto permaneceu no cargo até abril de 2024, quando a primeira fase da Operação Sem Desconto revelou indícios robustos de fraude. Diante do avanço das investigações, Lula determinou sua demissão, contrariando tentativas de Lupi de mantê-lo na função.
Alertas ignorados e mudanças legislativas favoreceram esquema
Documentos revelam que, ainda em 2023, a advogada Tonia Galleti, ligada ao Sindicato Nacional dos Aposentados (Sindnapi), alertou Lupi sobre irregularidades nos descontos de benefícios. Ela afirmou à CPI que nunca recebeu resposta institucional.
Apesar disso, Tonia e sua família entraram na mira da oposição. O relator da CPI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), afirmou que o grupo recebeu R$ 20 milhões do Sindnapi — valor que a advogada classificou como remuneração por serviços prestados.
O Sindnapi, presidido por sindicalistas históricos e que tem Frei Chico, irmão de Lula, como vice-presidente, teve R$ 390 milhões bloqueados por ordem do ministro do STF André Mendonça.
Outro ponto de atenção é uma mudança legislativa aprovada discretamente pelo Congresso antes da eleição de Lula: a revogação de uma regra criada em 2019 que obrigava a revisão periódica dos ACTs. A alteração, incluída em um projeto sobre microcrédito relatado pelo deputado Luís Miranda (Republicanos-DF), beneficiou diretamente entidades investigadas por aplicar descontos ilegais.
Entidades envolvidas participaram da transição
O grupo técnico de Previdência na transição contou com membros de entidades que hoje são alvo de investigações, como:
- Sindnapi, ligado ao irmão de Lula;
- Contag, presente no Conselho Nacional da Previdência Social;
- Representantes que participavam ativamente dos debates sobre benefícios e contribuições.
Entre os nomes estava também Luiz Antônio Adriano da Silva, o “Luizão”, secretário-geral do Sindnapi, indicado como coordenador do grupo.
Defesa contesta prisão
A defesa de Stefanutto afirma que o ex-presidente do INSS “é inocente” e tem colaborado com as investigações. Os advogados classificaram sua prisão como “ilegal” e alegam que não tiveram acesso completo à decisão do STF.
Enquanto isso, a Operação Sem Desconto avança na apuração de um esquema que, segundo a PF e a Controladoria-Geral da União, pode ter desviado bilhões por meio de descontos associativos fraudulentos aplicados em aposentadorias e pensões em todo o país.
