O presidente da República, em um de seus recentes episódios de autoglorificação em público, declarou que não está sujeito a prestar contas “a nenhum magnata deste país”. Esse momento revela uma profunda confusão de identidade. Embora tenha se referido a si próprio, ele descreveu uma pessoa que não é ele: o presidente Lula. Na realidade, é ele quem está constantemente prestando contas aos magnatas deste país. Isso é um fato. Seu mais recente gesto generoso para os amigos bilionários, o ato de doação à J&F, é exemplificado por uma medida provisória que isenta a Amazonas Energia de pagamentos devidos a termelétricas recentemente adquiridas pela Âmbar, uma empresa do grupo no setor de energia. O custo será repassado aos consumidores através das contas de luz pelos próximos quinze anos.
Uma medida provisória destinada a beneficiar uma empresa privada, envolta em controvérsias legais por corrupção, deveria ser reservada apenas para emergências que afetam gravemente o interesse nacional. No entanto, a J&F, como outras empresas amigas que variam da Odebrecht à Sete Brasil, faz parte do ecossistema natural de Lula e de seus operadores no governo. Aqui é onde os interesses privados encontram o Tesouro Nacional, como demonstrado pelo socorro à Âmbar, uma realidade prática do “Brasil Que Voltou” quando Lula se reúne com os magnatas. Não há preocupação em sequer manter as aparências. Na saga das termelétricas, diretores da J&F estiveram secretamente dezessete vezes no Ministério das Minas e Energia ao longo de onze meses antes da medida provisória ser emitida – encontros que não constavam na agenda oficial, exacerbando a situação.
Além disso, em maio, os próprios irmãos Batista se encontraram pessoalmente com o presidente no Palácio do Planalto, apenas nove dias antes da medida provisória ser emitida. E para adicionar à confusão, o ministro das Minas e Energia e o presidente da Âmbar tiveram uma reunião extraoficial no mesmo período. Após o escândalo vir à tona, o ministro tentou justificar as múltiplas visitas dos diretores da Âmbar ao ministério, insistindo que não havia conexão com a medida provisória em favor da empresa. De acordo com ele, foi tudo uma coincidência. Outra coincidência foi que a J&F finalizou a compra das usinas termelétricas por R$ 4,7 bilhões logo após a medida provisória ser apresentada.
Como sempre, o mais notável é que todo esse financiamento não brotou do nada. Mais uma vez, sairá diretamente do bolso do cidadão para os bolsos dos favorecidos – por mais que tentem justificar, esse é o fato. No seu manifesto contra “os ricos” (inclusive banqueiros), Lula afirmou que devia “prestar contas ao povo pobre”. Isso é exatamente o oposto. O presidente é um herói dos grandes bancos, amplamente admirado neste país. E as “contas ao povo pobre” que Lula menciona só podem se referir às contas de luz – que serão aumentadas nos próximos quinze anos para beneficiar a J&F. Para os ricos, contas de luz nunca são um problema; eles mal sabem quanto pagam. Mas para os verdadeiramente pobres, é um tormento constante e inevitável. Mais uma vez, fica claro que Lula está do lado dos bilionários. Os pobres recebem apenas esmolas – e o ônus das contas de luz.
Este não é um caso isolado de escândalo no governo dos justos. É o resultado natural da escolha feita por Lula desde o início de sua carreira política: tudo para empreiteiras, banqueiros e os privilegiados, e migalhas para os necessitados.