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domingo, 24 novembro, 2024
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O dilema brasileiro na crise da Venezuela

Por Marina B.

Ao iniciar a terceira semana de crise na Venezuela, o governo brasileiro mantém uma postura ambígua. No cenário internacional, o Brasil adota uma abordagem cautelosa. Diferente de vários governos latino-americanos, que reconheceram a vitória do opositor Edmundo González Urrutia ou denunciaram a fraude eleitoral, o Brasil, junto com os governos esquerdistas do México e da Colômbia, exige a apresentação das atas eleitorais antes de se posicionar. No entanto, essa postura tem sido usada como justificativa para a evidente simpatia do presidente Lula pelo regime bolivariano. A nota entusiástica do PT, celebrando a “vitória” de Nicolás Maduro menos de 24 horas após a eleição, reforça essa simpatia, considerando que o PT só se manifesta com a aprovação do presidente.

O pragmatismo adotado por Lula parece ser uma estratégia para manter a cumplicidade com o regime de Maduro, dado que o Brasil tem interesses a proteger em relação a Caracas e há o risco de um potencial “banho de sangue” prometido por Maduro. Romper relações, como fez o presidente argentino Javier Milei ou o ex-presidente Jair Bolsonaro, provou ser contraproducente tanto para os interesses brasileiros quanto para a pacificação na Venezuela.

Os EUA, por sua vez, não reconheceram González como presidente e têm promovido negociações secretas oferecendo anistia a Maduro e seus aliados em troca de uma transição de poder. Optar pela diplomacia em vez de punições tem se mostrado pertinente, já que a “pressão máxima” com sanções econômicas foi ineficaz. O governo de Maduro possui vulnerabilidades que podem ser exploradas para uma solução negociada.

Todo regime autocrático depende de dois pilares para sua sustentação: garantir o sustento da população e manter o apoio das Forças Armadas. Na Venezuela, o primeiro pilar está em colapso. Maduro usou repressão para conter protestos civis, mas a oposição está mais organizada. O governo depende cada vez mais do apoio militar, que parece sólido à primeira vista, mas apresenta fissuras visíveis.

A lealdade dos militares tem um preço. Com a economia em declínio, Maduro encontra dificuldade em financiar sua rede de corrupção clientelista. As receitas do narcotráfico não são suficientes. Apesar do apoio geopolítico da China e da Rússia, o apoio econômico não é tão garantido. A Rússia deseja manter altos os preços do petróleo e não se interessa em ajudar a Venezuela a aumentar a oferta global. A China, por sua vez, reluta em investir mais em um país que já lhe deve bilhões. O empobrecimento das famílias militares, a humilhação diante dos oficiais cubanos a serviço de Maduro e as prisões de soldados aumentam o ressentimento dentro dos quartéis. A combinação americana de promessas de anistia a dissidentes e ameaças de sanções aos apoiadores do regime busca ampliar essas fissuras.

Embora o Brasil tenha influência limitada neste jogo de forças, há ações que pode tomar. Com a provável não disponibilização das atas eleitorais, os argumentos de Lula se enfraquecerão. O Brasil não precisa romper relações com a Venezuela, mas também não deve reconhecer a vitória de Maduro.

O povo venezuelano expressou sua vontade nas urnas e a maioria insatisfeita tem demonstrado coragem e resiliência nas ruas. Esta semana está prevista uma conversa entre Lula e os presidentes da Colômbia e México com Maduro. Um presidente brasileiro comprometido com valores democráticos e direitos humanos deveria deixar claro que o Brasil apoiará a suspensão da Venezuela dos fóruns internacionais em que participa e, eventualmente, a imposição de sanções direcionadas aos responsáveis pela tirania. A questão é se Lula terá a firmeza necessária para isso. A retórica do pragmatismo tem lhe permitido evitar uma posição clara, mas o momento de decisão está se aproximando.

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