A proposta de desvincular o pagamento das aposentadorias do INSS do aumento real do salário mínimo, está enfrentando resistência de ministérios ligados às áreas sociais, o que também abre uma nova linha de ataque do PT contra o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Embora tenha sido a Ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), a responsável por externar a ideia, a liderança do PT avalia que Haddad tenha “terceirizado” a divulgação da notícia, lançando-a como um teste para medir a reação da população.
Além de Tebet, o Secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, também reconheceu que o governo Lula pode adotar novas medidas para conter o crescimento dos gastos previdenciários. Assim como a Ministra do Planejamento, Ceron considerou a questão como um “alerta”.
Embora ninguém do governo expresse claramente, na prática, o plano é revisar alguns benefícios sociais, atualmente vinculados ao aumento do salário mínimo, para impulsionar o ajuste fiscal.
Essa ideia não é nova. Durante o governo de Jair Bolsonaro, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu essa estratégia, que não foi adiante na época. Agora, ressurgiu, com diferentes argumentos, em uma entrevista de Tebet ao jornal Valor Econômico.
Segundo a ministra, o país não pode continuar indefinidamente com a política de valorização do salário mínimo para aposentadorias, Benefício de Prestação Continuada (BPC), seguro-desemprego e abono salarial. “Teremos que reduzir os gastos públicos por convicção ou necessidade”, afirmou Tebet.
Isso foi suficiente para desencadear críticas públicas ao “alerta” emitido pela equipe econômica.
“Sou totalmente contra essa proposta, acho-a absurda”, afirmou o Ministro do Trabalho, Luiz Marinho. “Se vamos propor algo assim, então vamos acabar de uma vez com a política de valorização contínua do salário mínimo”, acrescentou.
Para o Ministro da Previdência, Carlos Lupi (PDT), a sugestão de Tebet não tem chances de ser aceita. “Isso significaria retirar renda dos mais pobres da população”, observou Lupi. “Eu vou lutar contra isso.”
Desde o ano passado, a equipe econômica tem estudado maneiras de reduzir os reajustes dos benefícios previdenciários e sociais devido às dificuldades fiscais.
O objetivo do governo é eliminar o déficit em 2024 e 2025, embora o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha expressado sua frustração com esses números. “Essa é uma discussão que nenhum país do mundo enfrenta”, comentou Lula recentemente.
A Presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que o partido não pode apoiar a proposta de desvincular as aposentadorias do aumento real do salário mínimo.
“Isso vai contra tudo o que sempre defendemos”, enfatizou Gleisi. “Podemos cortar despesas com juros. Por que cortar dos mais pobres? Estamos falando das pessoas que recebem, no máximo, dois salários mínimos de benefício.”
Gleisi é uma das vozes mais críticas dentro do PT em relação à atuação do Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e já defendeu sua saída do cargo.
Ela argumenta que uma ideia como a proposta por Tebet não deveria sequer ser considerada em estudos e relatórios.
“Penso que deveríamos discutir isso com o governo. Seria bom que nos consultassem antes de divulgar algo assim”, disse Gleisi, alfinetando a Ministra. “Defendo o governo, mas essa é uma questão estrutural e histórica para nós.”
Ao mencionar as simulações feitas pelos ministérios do Planejamento e da Fazenda para incorporar o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) nos cálculos do piso constitucional da educação, Gleisi também manifestou sua oposição. E anunciou que o PT apresentará uma ideia oposta à de Haddad.
“Vamos levantar a bandeira para retirar a educação de qualquer limite fiscal, em vez de diminuir os gastos”, afirmou. “A educação avançou muito durante nosso governo, e é importante deixar claro a visão de país que defendemos.”
Até o momento, Lula não se pronunciou sobre o assunto, mas seus aliados garantem que é improvável que ele apoie a desvinculação dos benefícios previdenciários do aumento real do salário mínimo. Como candidato à reeleição em 2026, é pouco provável que ele queira se indispor com essa parcela do eleitorado.
“Seria uma traição, porque vai contra o que está em nosso programa de governo”, argumentou o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ). Para ele, toda essa discussão decorre de um erro inicial: manter a previsão irreal de eliminar o déficit este ano.
Haddad também não comentou a ideia apresentada por Tebet ou Ceron. No entanto, recentemente, ele recomendou a leitura de um artigo do economista da FGV Bráulio Marcos sobre a dinâmica das contas públicas.
“Os pisos previdenciários e de benefícios assistenciais deveriam ser corrigidos apenas pela inflação, e não pelo salário mínimo nacional”, escreveu Marcos em um trecho.
Haddad uma vez mencionou que o PT fez uma aposta para ver quanto tempo ele duraria no cargo. Parece que ele não estava errado. Ao que tudo indica, estamos prestes a testemunhar mais uma temporada da série “austericídio fiscal”. Resta saber se esses episódios se estenderão até 2026.
Já no caso da ministra Tebet, depois dessa “ideia” e da declaração desastrosa sobre os recursos para as prefeituras do RS, de que o dinheiro vai mas não agora, fica a pergunta: Haddad colocou a ministra como alvo, ou é o governo quer matar dois coelhos com um tiro só?