Compra para evento climático expõe possível desperdício de quase R$ 900 mil em comparação a contratos similares da própria administração pública
O governo federal, sob gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), contratou a compra de galões de água mineral para a organização da COP30 com preços até 611% superiores aos praticados em outras compras públicas recentes. A informação foi revelada pela coluna de Tácio Lorran, no portal Metrópoles, e gerou forte repercussão diante do aparente descontrole nos gastos e da incoerência com o discurso de responsabilidade social.
Ao todo, o governo vai pagar R$ 1 milhão por 51 mil galões de 20 litros, destinados à conferência climática da ONU que será realizada em Belém (PA) em 2025. O levantamento do Metrópoles, com base no Painel de Preços do governo federal, identificou que os mesmos galões foram adquiridos recentemente por valores entre R$ 3,30 e R$ 10,10 em diversos órgãos públicos, enquanto na COP30 os preços chegaram a R$ 30,22 a unidade.
Em contraste, o Senado Federal, por exemplo, firmou em abril um contrato para fornecer 60 mil galões de água a R$ 4,25 cada — sete vezes mais barato do que os valores praticados na COP.
Organização terceirizada, preços inflados
A responsabilidade pela compra recai sobre a Organização dos Estados Ibero-Americanos (OIE), contratada sem licitação para estruturar o evento em um acordo com valor total de R$ 480 milhões, do qual a entidade recebe 5% como taxa administrativa. O contrato já vinha sendo questionado por prever outros itens com preços elevados, como garrafas de água de 500 ml inicialmente cotadas a R$ 17,50 cada, como revelou a Folha de S.Paulo.
Segundo o governo, o valor final dos galões caiu pela metade após a licitação conduzida pela OIE, mas ainda assim ficou muito acima das práticas usuais da administração pública — inclusive em órgãos que atuam na própria Região Norte.
Comparações expõem ineficiência
Outros exemplos de compras similares feitas por órgãos federais expõem a discrepância:
- Universidade Federal do Acre (UFAC): 49,5 mil galões a R$ 4,95 cada;
- Justiça Federal em Pernambuco: 36,2 mil galões a R$ 3,80;
- Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz): 55,8 mil galões a R$ 5,55;
- Marinha do Brasil: 40,9 mil galões a R$ 3,89 e outros 41,9 mil a R$ 4,95.
Mesmo com essa base comparativa e compras em regiões de difícil logística, como a Amazônia, o governo Lula pagará até sete vezes mais por produto semelhante, gerando um prejuízo estimado de R$ 896 mil apenas nessa aquisição.
Discurso ambiental e prática orçamentária em desacordo
A revelação da coluna de Tácio Lorran ocorre num momento em que o governo tenta projetar liderança global em temas ambientais, mas enfrenta críticas crescentes por gestão ineficiente de recursos e aumento de gastos públicos.
Críticos apontam incompatibilidade entre o discurso de sustentabilidade e os altos custos de um evento que deveria priorizar economicidade, transparência e foco ambiental. O uso de uma organização internacional como intermediária e a dispensa de licitação também levantam questionamentos sobre o modelo adotado pela Casa Civil para a realização da conferência.
A Secretaria Extraordinária para a COP30 afirmou que todos os itens passam por revisão e justificou os valores com base nos custos locais de Belém, embora dados de outros contratos públicos na mesma região contrariem a explicação.
Repercussão
A polêmica aumenta o desgaste do governo Lula em relação ao controle de gastos, num cenário em que a população sofre com aumento de impostos, crise fiscal nos municípios e escândalos como o do INSS. Especialistas alertam que a falta de transparência e o distanciamento entre discurso e prática podem comprometer a credibilidade do Brasil no cenário internacional, especialmente em eventos que exigem exemplaridade ética e ambiental.