Contratos bilionários com empresa ligada a família política levantam suspeitas de favorecimento e uso da máquina pública, aponta Estadão.
Desde que Carlos Brandão (PSB) assumiu o governo do Maranhão, em abril de 2022, uma única empresa de engenharia, a Qualitech, recebeu R$ 909 milhões em contratos com a administração estadual — valor que representa cerca de 80% do total recebido pela companhia nos últimos dez anos. A informação foi revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo nesta segunda-feira (7).
A Qualitech pertence a Fred Campos (PSB), atual prefeito de Paço do Lumiar — cidade a apenas 20 quilômetros de São Luís — e ao pai dele. O que chama ainda mais atenção é o grau de parentesco envolvido: a vice-prefeita da cidade é Mariana Brandão (MDB), sobrinha do governador.
Durante os sete anos em que Carlos Brandão foi vice-governador de Flávio Dino, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), a Qualitech recebeu R$ 220 milhões. Mas com a chegada de Brandão ao comando do Palácio dos Leões, os contratos dispararam: só entre 2022 e 2024, a média anual de repasses chegou a R$ 260 milhões.
A maior parte dos contratos foi prorrogada ou ampliada sem nova licitação. Um dos maiores aditivos ocorreu em agosto de 2024, já durante a campanha municipal: R$ 65 milhões para obras viárias na Grande São Luís, enquanto Mariana Brandão disputava a eleição como vice-prefeita ao lado de Fred Campos.
Prefeito investigado e parentes empregados
Fred Campos já foi investigado pela Polícia Federal, chegou a usar tornozeleira eletrônica durante a campanha, e foi indiciado por manipulação de decisões judiciais e desvio de recursos do Banco do Nordeste. Mesmo assim, sua empresa tornou-se protagonista nas finanças estaduais sob a gestão do aliado.
As conexões familiares não param aí. Tramitam ações no Supremo Tribunal Federal sobre o uso da máquina pública para empregar parentes do governador, o que levou o ministro Alexandre de Moraes a determinar o afastamento de pelo menos três deles — incluindo Marcus Brandão, irmão do governador e ex-secretário de Articulação Política, e o genro, que ocupava cargo na Secretaria de Infraestrutura.
Governo nega irregularidades, mas não convence
Em nota, o governo do Maranhão negou qualquer irregularidade. A Secretaria de Comunicação justificou que mais da metade dos valores pagos à Qualitech se referem a obras herdadas da gestão Flávio Dino, e que todos os contratos foram firmados “dentro da legalidade”.
“O Governo do Estado esclarece que todos os contratos firmados com prestadores de serviços diversos estão dentro da legalidade, e que arca com os compromissos firmados institucionalmente, atuando com responsabilidade e compromisso com o dinheiro público”, diz o comunicado oficial.
Contrastes chamam atenção
Em 2022, Carlos Brandão declarou à Justiça Eleitoral apenas R$ 479 mil em bens, mesmo após movimentar cifras bilionárias como governador. A diferença entre os valores declarados e os contratos firmados com empresas próximas alimenta suspeitas no Ministério Público Eleitoral e reforça críticas de aparelhamento da máquina pública e favorecimento de aliados políticos e familiares.
Enquanto isso, a Qualitech teve seu capital social multiplicado em quase 700% entre 2017 e 2021 — passando de R$ 410 mil para R$ 3,2 milhões. E agora, também figura como uma das maiores prestadoras de serviço do Estado.
Em meio a um histórico de investigações e relações familiares entre os principais beneficiados por recursos públicos, a gestão de Carlos Brandão enfrenta crescentes acusações de favorecimento político, uso indevido de cargos públicos e descontrole administrativo. Os desdobramentos podem se tornar ainda mais delicados em ano pré-eleitoral, com a pressão crescente por transparência e responsabilização no uso do dinheiro do contribuinte maranhense.
