Com informações da Revista Oeste_
O escândalo revelado pela Revista Oeste escancarou a existência de um “gabinete paralelo” chefiado pelo ministro Alexandre de Moraes, tanto no Supremo Tribunal Federal (STF) quanto no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Esse núcleo, composto por assessores e auxiliares diretos do ministro, teria atuado como uma espécie de polícia política informal, perseguindo opositores, censurando a imprensa e extrapolando as competências constitucionais.
Segundo a investigação da Oeste, relatórios produzidos sob demanda, ordens transmitidas em grupos de WhatsApp, “certidões” que definiam prisões ou liberdades e até bloqueios de plataformas digitais eram decididos fora do devido processo legal.
Juristas ouvidos pela revista apontam que o cerne da ilegalidade começa no Inquérito das Fake News, aberto em 2019 sem sorteio e entregue a Moraes por decisão do então presidente do STF, Dias Toffoli.
“O juiz não pode investigar. A função de investigar é da polícia judiciária, e atipicamente do Ministério Público. Quando Moraes passou a indicar alvos, cobrar relatórios e autorizar diligências, ele rompeu a fronteira constitucional”, disse o criminalista Gauthama Fornaciari de Paula.
Ele alerta que essa confusão de papéis mina a imparcialidade:
“Quando o mesmo ator escolhe o alvo, coleta as provas e julga, o processo deixa de ser justo e se torna uma simulação de justiça.”
As mensagens obtidas pela Vaza Toga mostram ordens do STF sendo executadas por servidores do TSE, numa fusão de competências inexistente na Constituição.
Para o advogado constitucionalista André Marsiglia, trata-se de grave desvio institucional:
“Servidores do TSE, que deveriam atuar em questões técnicas eleitorais, foram usados como uma polícia secreta de Moraes. É típico de regimes autoritários.”
Certidões ilegais: “culpa” por memes e camisetas
Entre os episódios mais escandalosos revelados estão as chamadas certidões positivas e negativas, que determinavam se manifestantes do 8 de janeiro seriam presos ou libertados.
Críticas ao STF, memes contra Lula ou até usar camiseta da Seleção Brasileira bastavam para render uma certidão positiva, ou seja, prisão mantida.
Casos concretos comprovam o absurdo:
- Claudiomiro da Rosa Soares, caminhoneiro, preso por compartilhar memes sobre Lula.
- Ademir Domingos da Silva, ambulante, enquadrado por tuítes antigos de 2018.
- Adenilson Demétrio de Cordova, condenado apenas por postagens em redes sociais.
“Essas certidões são absolutamente ilegais. Separar pessoas por preferência política é inconstitucional. Dentro do gabinete parecia existir um departamento de eugenia ideológica”, denunciou Marsiglia.
Constituição violada
A constitucionalista Vera Chemim reforça que Moraes usurpou funções de outros órgãos:
- Polícia Judiciária → investiga.
- Ministério Público → acusa.
- Juiz → julga.
“Quando o juiz assume papéis de investigador e acusador, ele afronta diretamente os artigos 128, 129 e 144 da Constituição”, afirmou.
Além disso, os atos violam liberdades fundamentais garantidas no artigo 5º, além de se enquadrarem em abuso de autoridade e até em crimes de responsabilidade.
O que é a Vaza Toga
A chamada Vaza Toga revelou documentos e mensagens internas que mostrariam como Moraes e seus assessores atuaram fora da lei para perseguir opositores políticos. As primeiras denúncias foram feitas por jornalistas como Glenn Greenwald e Fábio Serapião, e novos detalhes foram apurados por David Ágape e Eli Vieira, publicados na Oeste e no site Public.
O caso coloca em xeque não apenas a atuação de um ministro do Supremo, mas também os limites institucionais da democracia brasileira. Para os juristas, as práticas reveladas configuram usurpação de funções, censura e perseguição política — violações que não podem ser normalizadas em um Estado de Direito.