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segunda-feira, 25 novembro, 2024
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Fim do brilho: Brasil afunda no cenário de investimentos globais

Por Alexandre G.

Em meio às turbulências geradas pelo relaxamento das metas fiscais para os próximos anos, o Brasil enfrenta uma perda de terreno no cenário global de investimentos em comparação com seus pares emergentes, como o México e a Índia. “Atualmente, ciclicamente, o Brasil não possui uma narrativa muito distinta”, afirma Karina Saade, presidente da BlackRock no país, em entrevista ao Estadão/Broadcast.

A maior gestora de ativos do mundo prevê que o Federal Reserve (Fed) reduza as taxas de juros “no máximo” duas vezes neste ano, diante dos sinais de inflação persistente nos Estados Unidos. Para Karina, esse cenário favorece o fluxo de capitais para a maior economia do mundo, o que terá implicações globais. Abaixo estão os principais pontos da entrevista:

Recentemente, houve uma reavaliação dos mercados em relação aos planos do Fed. Como a BlackRock interpreta esse movimento?

Nossa expectativa para este ano é de, no máximo, dois cortes nas taxas de juros nos Estados Unidos, provavelmente iniciando após setembro. O Federal Reserve (Fed) reduzirá as taxas, mas não tanto quanto inicialmente previsto. Isso se deve ao fato de que taxas de juros elevadas equivalem a uma tributação regressiva para os segmentos de baixa renda. Observamos uma taxa de inadimplência significativamente alta nesses segmentos. Portanto, é necessário aliviar essa pressão sobre os consumidores de baixa renda. No entanto, a inflação nos Estados Unidos tem se mostrado mais persistente do que o esperado, e nossa visão é que isso continuará. Isso ocorre porque a inflação nos serviços persiste. A economia americana é mais dependente de serviços do que de bens de consumo, e os preços dos serviços não são tão sensíveis à política monetária. Essa forma de inflação é mais desafiadora para o banco central reverter e provavelmente persistirá por mais tempo, o que dificultará o ritmo dos cortes de juros pelo Federal Reserve.

Qual é o impacto desse cenário no cenário global de investimentos?

As consequências para os mercados emergentes são negativas, pois os Estados Unidos terão uma economia mais forte e taxas de juros mais altas do que historicamente. Além disso, haverá uma necessidade significativa de financiamento futuro por parte do Tesouro americano. Isso resultará em uma repatriação de dólares para os Estados Unidos. Veremos um fluxo de capital se dirigindo mais fortemente para os Estados Unidos.

Como o Brasil se posiciona nesse contexto?

Estruturalmente, o Brasil possui diversas tendências positivas, como tendências demográficas favoráveis e um posicionamento promissor em relação à transição energética, além de possuir abundantes recursos naturais. No entanto, ciclicamente, o Brasil não apresenta uma narrativa muito distinta no momento. Apesar das taxas de juros ainda elevadas, países como o México e a Índia possuem narrativas de curto prazo mais claras. No curto prazo, o Brasil não está tão favorecido em comparação com os Estados Unidos ou outros emergentes, como Índia e México.

O aspecto fiscal é um obstáculo?

A revisão das metas fiscais não ajuda muito neste momento. Embora a meta esteja mais alinhada com a realidade, a alteração sinaliza um menor comprometimento. Portanto, estamos em um momento em que o Brasil está se tornando mais secundário e menos focado para os investidores estrangeiros em comparação com alguns outros mercados emergentes ou até mesmo desenvolvidos, como o Japão.

Mas o temor do mercado está mais relacionado à sinalização ou à trajetória da dívida em si?

Acredito que esteja mais relacionado à sinalização do que à trajetória. No entanto, os investidores estrangeiros estão menos preocupados com a questão fiscal do que os investidores locais. O que realmente falta para os investidores estrangeiros é uma narrativa diferenciada.

Como os recentes eventos geopolíticos envolvendo Irã e Israel se encaixam nesse momento?

Enxergamos três cenários possíveis a curto prazo. O primeiro cenário é Israel não responder, o que consideramos pouco provável. O segundo cenário é Israel retaliar, mas a escalada do conflito permanecer contida na região, o que consideramos mais provável. O terceiro cenário é Israel acabar arrastando os Estados Unidos para o conflito, o que também vemos como pouco provável. Considerando esse segundo cenário, vemos algumas consequências possíveis, como um choque energético, o que obviamente afetaria os mercados globais. Isso já está sendo refletido no preço do petróleo. E quando o preço do petróleo sobe, isso é inflacionário. A inflação certamente se torna mais volátil e mais vulnerável a choques. Isso pode resultar em uma redução do ritmo de cortes pelo Banco Central Europeu – algo menos provável nos Estados Unidos, que são mais autossuficientes em energia.

A BlackRock tem focado mais na renda fixa europeia. Por quê?

Dentro da renda fixa, preferimos o mercado de crédito em vez da dívida soberana, pois esperamos que as empresas melhorem seus resultados e mantenham balanços saudáveis. Não vemos um evento de crédito no futuro próximo, já que muitas empresas refinanciaram suas dívidas quando as taxas de juros estavam mais baixas. O mercado americano é bom, mas os preços corporativos já refletem isso. Nossa preferência pela dívida corporativa europeia se deve mais a uma questão de precificação.

O Japão tem sido outro destaque na tese de investimentos da BlackRock. O aperto monetário incipiente no país muda algo?

Continuamos bastante otimistas em relação ao Japão, especialmente em relação às ações japonesas. Apesar do aumento, as taxas de juros no Japão permanecerão relativamente baixas. Estamos vendo um ressurgimento da inflação, o que consideramos positivo porque indica crescimento. No ano passado, os ganhos salariais no Japão foram de cerca de 5,3%, os mais altos dos últimos 30 anos. Isso é positivo, pois impulsionará o consumo e indica uma perspectiva de crescimento favorável no Japão. Além disso, temos observado o que chamamos de revolução silenciosa no ambiente corporativo do Japão, com uma série de reformas significativas em termos de governança, que beneficiaram os acionistas e as empresas. O terceiro ponto diz respeito aos fluxos de entrada no Japão, especialmente de investidores estrangeiros. Em 2023, o Japão registrou uma entrada de US$ 17 bilhões.

Quais são os principais riscos e oportunidades para os mercados neste ano?

Estamos enfrentando os dois maiores riscos. Em primeiro lugar, a política monetária do Fed. Ninguém sabe ao certo o que o Fed fará, e isso representa um risco significativo para todos os mercados. O segundo risco é geopolítico. Estados Unidos e China, por exemplo, estão em um momento de tensão, o que pode gerar incertezas nos mercados. Quanto às oportunidades, gostamos muito do crédito privado. Nossa principal tese é que os bancos estão recuando na concessão de crédito, e os mercados de capitais estão preenchendo essa lacuna. Para o mercado de ações, esperamos que continue em alta nos Estados Unidos. Isso se deve à oferta e à demanda: há poucos IPOs, mas as empresas estão recomprando suas próprias ações, o que gera uma demanda significativa. No entanto, gostamos de alguns setores específicos, como o de saúde. Com o envelhecimento da população, a demanda por serviços de saúde tende a aumentar. Portanto, é um setor estruturalmente atrativo. Além disso, existem setores que se beneficiarão das inovações em inteligência artificial.

As eleições nos Estados Unidos representam um risco?

Obviamente, há alguma incerteza até que o resultado final seja conhecido, mas uma vez que isso aconteça, é mais uma questão de política para cada um dos candidatos e como ela afeta os diferentes setores da economia. É mais uma questão de dispersão entre os setores, pois cada candidato tem políticas muito diferentes.

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