Apesar de apoiar os esforços de diálogo liderados pelo Brasil, em colaboração com México e Colômbia, alguns países aliados manifestam receios e identificam ambiguidades na proposta atual para checar o resultado da eleição presidencial na Venezuela. Nos bastidores diplomáticos, potências como França e EUA, membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, expressam preocupações sobre a verificação dos resultados dentro da Venezuela, especialmente sobre a forma de proceder com a checagem pelos grupos políticos locais – chavismo e oposição.
Esse seria o próximo passo após a possível divulgação das atas eleitorais pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), que deveriam apresentar os resultados detalhados por zona eleitoral de forma completa e transparente. Atualmente, Brasil, Colômbia e México defendem essa abordagem em dois comunicados conjuntos dirigidos ao regime chavista, refletindo a postura de governos alinhados historicamente com o chavismo.
Ceticismo Internacional
Recentemente, o Estadão conversou com diplomatas brasileiros e internacionais, incluindo representantes de potências ocidentais, que acompanham as negociações e mantêm diálogo constante com o Itamaraty. Esses diplomatas falaram sob condição de anonimato.
Os EUA e a União Europeia já declararam que as evidências disponíveis até agora indicam uma vitória de González e a derrota do regime de Maduro. Baseiam essa opinião em análises das 24.576 atas de mesas de votação (82% do total) coletadas e divulgadas pela oposição, que foram avaliadas como confiáveis por instituições independentes e comparadas com contagens rápidas e pesquisas de boca de urna.
Há reconhecimento e apoio à abordagem brasileira de manter o diálogo aberto para mediação entre o regime e a oposição, considerada uma postura pragmática e positiva. No entanto, a maioria dos diplomatas acredita que seria necessária uma verificação internacional dos resultados, após a publicação das atas.
Um diplomata com experiência em Caracas afirmou que é improvável encontrar alguém dentro da Venezuela capaz de realizar uma auditoria confiável, uma vez que quem denuncia o regime pode enfrentar prisão ou tortura. Portanto, a presença de um ente externo seria crucial.
Entre as opções discutidas estão a missão de observação eleitoral da União Europeia, o painel de especialistas eleitorais da ONU e as autoridades eleitorais da Colômbia e do Brasil.
Intermediação e Controvérsias
Brasil, México e Colômbia pedem ao regime de Maduro uma “verificação imparcial dos resultados” e destacam que as soluções devem vir da própria Venezuela. Lula, Gustavo Petro e Andrés Manuel López Obrador tentam organizar uma chamada conjunta para discutir o assunto e posteriormente se comunicar com Maduro e o candidato opositor.
Os governos dos três países evitaram reconhecer imediatamente a reeleição de Maduro, que foi anunciada com 52% dos votos contra 43% de González, conforme informado pelo CNE sem evidências públicas. A oposição alegou fraude e declarou vitória com 67% dos votos, conforme atas coletadas por seus militantes. Esse impasse persiste tanto na Venezuela quanto na comunidade internacional.
Nuances na Tríade
Apesar do consenso sobre a necessidade de divulgação das atas, há diferenças entre Brasil, México e Colômbia. O presidente colombiano Gustavo Petro defendeu uma contagem dos votos sob “supervisão internacional profissional”. Brasil e México, por outro lado, resistem a essa abordagem e preferem focar apenas na imparcialidade da verificação, deixando a decisão sobre o processo a cargo das partes envolvidas.
O Brasil usou esse argumento para se abster e derrubar uma resolução na OEA que inicialmente propunha a verificação com observadores internacionais. Quando Lula minimizou a disputa, sugeriu que a oposição recorresse à Justiça venezuelana, embora os diplomatas reconheçam que a cúpula judicial é alinhada ao chavismo, o que comprometeria a imparcialidade.
PT e Postura de Maduro
Setores do PT criticam a postura de Lula, sugerindo que ele deveria ter reconhecido a reeleição de Maduro, como fez o partido. O ex-presidente José Genoino afirmou que aceitar a verificação de eleições por governos estrangeiros poderia abrir um precedente indesejável e violar princípios constitucionais de não intervenção e autodeterminação dos povos.
O presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador foi enfático ao rejeitar a pressão sobre o regime via OEA, acusando o órgão de falta de credibilidade e intervencionismo. O ex-chanceler Celso Amorim, assessor especial de Lula, também criticou a OEA e argumentou que a União Europeia poderia ter desempenhado um papel crucial se tivesse relaxado as sanções ao regime, permitindo o envio de uma missão de observação.
No entanto, diplomatas europeus duvidam que a presença de uma missão de observação mudaria o resultado, e até membros do Itamaraty admitem que a disputa não ocorreu em condições justas e que as negociações pós-votação estão comprometidas.
Negociações em Curso
O ministro Mauro Vieira intensificou as conversas com seus homólogos internacionais, incluindo México, Colômbia, Espanha, Portugal, Reino Unido e França, enfatizando a necessidade de divulgação das atas eleitorais. No entanto, o ceticismo sobre a publicação dos resultados oficiais persiste, e há especulações sobre possíveis tentativas de falsificação das atas pelo regime.
Observadores eleitorais, como o cientista político Ian Batista do Centro Carter, afirmam que os documentos e equipamentos de votação estão sob custódia militar, o que pode limitar a transparência. Eles também questionam a alegação de um ataque hacker, dado que a transmissão de dados é feita por linhas telefônicas criptografadas e não há evidências concretas desse ataque.
*Com informações, Gazeta do Povo.