Com a oposição na Venezuela unida em torno da candidatura do ex-embaixador Edimundo González Urrutia, roubar as eleições e conquistar a legitimidade que busca será mais difícil do que Nicolás Maduro pensava, avalia Andrés Oppenheimer. Considerado pela revista Foreign Policy “um dos 50 intelectuais latino-americanos mais influentes” do mundo, ele estreia esta semana sua coluna no Estadão, que será publicada todas as terças-feiras no online, e às quartas no impresso. A coluna de estreia, excepcionalmente, será publicada online nesta segunda-feira, 20.
Oppenheimer é colunista do The Miami Herald, apresentador do programa Oppenheimer Apresenta na CNN em Espanhol, autor de oito best-sellers e acaba de publicar ¡Cómo Salir del Pozo! (Como Sair do Buraco, em tradução livre), em que analisa o fenômeno global da insatisfação e mostra, entre outras coisas, que os latino-americanos não são tão felizes como se convencionou pensar.
Em entrevista ao Estadão, Oppenheimer analisou o cenário político da região, a começar pelas eleições na Venezuela, até então, marcadas pelo esforço de Nicolás Maduro para barrar os principais opositores. Com isso, aliados de longa data do ditador, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, começaram a perceber que manter o apoio é um “mau negócio” — e essa pressão tende a contribuir para um desfecho pacífico em Caracas.
“Lula e Petro [presidente da Colômbia] estão percebendo que é mau negócio ser aliado de Maduro. É mau negócio porque desvaloriza a marca dos seus partidos de esquerda se aliar com um ditador sanguinário como Maduro, que ameaça produzir mais caos na Venezuela, o que se traduziria em mais milhões de refugiados venezuelanos em seus países e em todo o continente”, afirma.
Isso no momento em que a mais recente onda de esquerda na região parece ter atingido o ponto máximo, com o surgimento de novos governos, como Paraguai, Argentina e Equador, operando em sinal oposto, observa Oppenheimer, ponderando que esses rótulos tem cada vez menos significado no mundo real. “O grande dilema no mundo hoje não é entre a esquerda e a direita, mas entre a democracia e a ditadura.”
Além do contexto sul-americano, Oppenheimer falou sobre as eleições nos Estados Unidos que, avalia, serão muito mais acirradas do que sugerem as pesquisas neste momento e de crises globais como a guerra na Ucrânia.
Leia a entrevista (parte)
Apesar das investidas do ditador Nicolás Maduro, a oposição na Venezuela está unida em torno de Edimundo González Urrutia. E você entrevistou recentemente María Corina Machado, que se mostrou otimista. Há esperança de mudança?
Eu falei com María Corina Machado há alguns dias e a vi mais otimista do que nunca. Claro, eu não sou ingênuo. Todos os políticos em campanha sempre se mostram otimistas. Mas o que me chamou a atenção é que quando perguntei qual seria a reação da oposição se Maduro cancelasse as eleições, ela se mostrou categoricamente contra. O que me faz pensar que seu otimismo pode ser sincero, porque se pensasse que perderia, não se incomodaria que suspendessem as eleições.
E em segundo lugar, na entrevista, ela se mostrou surpreendentemente muito a favor de que a União Europeia, as Nações Unidas e o Centro Carter venham observar as eleições na Venezuela, que, como você sabe, são missões eleitorais que foram muito criticadas em alguns casos pelos setores mais antichavistas, tanto na Venezuela como no Congresso dos Estados Unidos, por considerarem que aceitaram observar eleições fraudulentas e dar certa credibilidade às eleições de Maduro. Ela me disse, definitivamente, quero que venham as missões eleitorais. E isso também me dá a pista, me faz pensar que está sinceramente otimista de que a oposição, apesar de todas as armadilhas eleitorais que Maduro colocou, possa fazer uma boa eleição.
Maduro pode sair do poder?
Não sei… Eu não acredito que Maduro vai sair do poder muito facilmente, mas acredito que vai ser muito mais difícil do que ele pensava roubar essas eleições. Roubar essas eleições e conseguir certo reconhecimento internacional, certa legitimidade internacional, que é o que ele está procurando. Acho que vai ser muito mais difícil do que ele pensava.
Depois de uma crítica inédita ao regime, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, apresentou um ‘plano de paz’ para Venezuela que, em caso de vitória da oposição, seria como uma anistia para Maduro. Essa é a saída para pacificar o país? Eu acho que a Petro deve ser visto com muita desconfiança, mas o certo é que algum tipo de acordo vai ter que haver, como houve na Nicarágua no final dos anos 80, como houve no Chile no final da ditadura de Pinochet. E a própria María Corina Machado está dizendo hoje que tem que haver garantias para os perdedores. Mais ou menos, está dizendo que tem que haver uma saída minimamente viável. Que Maduro possa passar o resto da vida comendo em bons restaurantes em Madri e não tenha que ir para Cuba — porque não acho que ele queira ir (risos). O fato de ela estar falando isso, indica que vai por esse lado.
Mas voltando a como seria para Maduro roubar as eleições, eu acho que Petro e Lula estão percebendo que serem aliados de Maduro é um mau negócio. É mau negócio político para eles porque desvaloriza a marca de seus partidos de esquerda se aliar com um ditador sanguinário como Maduro, que ameaça produzir mais caos na Venezuela, o que se traduziria em mais milhões de refugiados venezuelanos em seus países e em todo o continente, em mais poder