Despesas discricionárias, especialmente as emendas parlamentares, mantiveram expansão e devem continuar pressionando as contas públicas no fim do ano
Embora o Tesouro Nacional tenha anunciado nesta quinta-feira que o governo central teve um déficit primário de R$ 100,4 bilhões no ano até setembro, os economistas acreditam que o dado veio dentro das projeções e não demanda novos bloqueios orçamentários para cumprimento do teto de gastos neste ano. Mas eles alertam para incertezas em 2026, mantida a continuidade do cenário adverso no ano que vem.
Especificamente em setembro, o resultado primário ficou negativo em R$ 14,5 bilhões, superior ao déficit de R$ 5,2 bilhões observado no mesmo mês de 2024, mas dentro da mediana das projeções, em torno dos R$ 15 bilhões.
Tiago Sbardelotto, economista da XP, destacou em análise que as receitas líquidas cresceram 0,6% na comparação entre os meses de setembro de 2024 e 2025. No entanto, as despesas totais aumentaram 5,7% em termos reais na mesma comparação.
Entre os destaques na ponta da receita, ele citou a arrecadação líquida para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), com alta de 11,9% anuais, refletindo o mercado de trabalho ainda aquecido e a redução nas compensações tributárias. Também foi citada a expansão do IOF por conta das alíquotas maiores no período.
Já na ponta das despesas, as discricionárias avançaram 100,9% em termos anuais, refletindo a aceleração da execução orçamentária no segundo semestre, sobretudo em razão das emendas parlamentares. Outros fatores que contribuíram para o aumento das despesas foram o seguro-desemprego e o abono salarial (+19,3%) e o Benefício de Prestação Continuada – BPC/LOAS (+5,8%).
“As despesas discricionárias, especialmente as emendas parlamentares, mantiveram expansão e devem continuar pressionando as contas públicas no fim do ano. Já as despesas obrigatórias mostraram moderação, influenciadas pelo aumento da fila de concessão de benefícios previdenciários e assistenciais”, comentou Sbardelotto.
Para os próximos meses, a XP projeta nova desaceleração no crescimento da arrecadação tributária, à medida que a atividade econômica, a taxa de câmbio e os preços perdem força. “Isso deve ampliar a dependência de receitas extraordinárias, como os pagamentos de leilões de áreas de petróleo não contratadas, previstos apenas para o fim do ano”, afirmou.
A XP está com projeção de déficit primário de R$ 60,7 bilhões para 2025, o equivalente a 0,5% do PIB. Essa conta recua para R$ 10,4 bilhões (0,1% do PIB) ao se excluir as exceções do cálculo para a meta primária –permanecendo, assim, acima do limite inferior da meta fiscal (-R$ 31,0 bilhões).
“Mantemos a visão de pressões de despesa, especialmente em benefícios previdenciários e BPC/LOAS, mas não antevemos necessidade de novos bloqueios orçamentários para cumprimento do teto de gastos neste ano”, disse o economista.
Na opinião de Rafaela Vitoria, economista-chefe do Inter, o resultado fiscal do governo em setembro mostra o desafio do cumprimento da meta de zerar o déficit em 2025 no cenário de desaceleração da receita.
“A receita total teve alta real de 2,7% no mês na comparação com o mesmo mês no ano anterior, com queda de 1% na receita administrada, parcialmente compensada pela alta de 11,9% na arrecadação da previdência, resultado do mercado de trabalho ainda robusto. No acumulado do ano, o crescimento real da receita administrada está em 4,2%, e os dados dos últimos meses apontam para uma desaceleração significativa”, afirmou.
Rafaela alertou que, por outro lado, as despesas seguem o caminho inverso, com crescimento no mês de 5,7% acima da inflação, bem acima da média acumulada do ano de 2,8%. E também citou que o principal impacto veio das despesas discricionárias com alta de 22,9% acima da inflação, enquanto as despesas com previdência tiveram maior estabilidade e outras despesas obrigatórias crescendo mais próximo de 2%, também acima da inflação.
“Nesse cenário, revisamos nossa projeção de déficit para R$ 59 bilhões em 2025, cerca de 0,5% do PIB, ainda dentro da meta considerando o intervalo inferior e excluindo as despesas com precatórios e outras”, previu.
A tendência de desaceleração da arrecadação deve continuar em 2026, enquanto a maior demanda por gastos em ano de eleição deve continuar pressionando o resultado fiscal, mantendo o cenário de incerteza e percepção de risco elevado”, advertiu.
Na semana passada, a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado avaliou que o governo precisará de um esforço adicional de R$ 27,1 bilhões no último trimestre de 2025 para alcançar a meta de resultado primário zero, estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
A avaliação partia de uma projeção de déficit primário de R$ 100,9 bilhões até setembro, e levava em conta a perda de eficácia da MP 1.303, que estabelecia medidas de compensação tributária e que foi arquivada pela Câmara.
“A perda de eficácia da Medida Provisória no 1.303, que implicará em R$ 10,6 bilhões a menos em receitas neste ano, e a piora no déficit primário das empresas estatais impõem riscos adicionais ao cumprimento da meta fiscal de 2025”, dizia o documento com as projeções da IFI.