O Brasil, líder mundial na produção de café com 55 milhões de sacas de 60 quilos por ano, está conquistando reconhecimento não apenas pela quantidade, mas também pela qualidade superior no mercado global da commodity. Isso tem permitido ao país aproveitar os altos preços globais e consolidar mercados importantes para o grão, como Londres, onde um café expresso pode custar até R$ 25 após mais que dobrar de preço, e países da Ásia como China e Coreia do Sul, onde o café tem ganhado preferência sobre o chá, com marcas brasileiras se tornando populares.
Um marco recente foi o acordo assinado no início de junho pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, para exportar 120 mil toneladas para as 16 mil lojas da Luckin Coffee, a maior rede de cafeterias da China. Nos últimos vinte anos, a indústria brasileira de café tem se esforçado para mudar sua imagem no exterior, melhorando a percepção de qualidade do produto.
“O Brasil é o maior produtor mundial, seguido por Vietnã e Colômbia. Historicamente, o café colombiano era mais reconhecido internacionalmente como especial. Recentemente, no entanto, o café brasileiro começou a ser aceito com um leve deságio como padrão de liquidação no mercado futuro de Nova York, que antes só considerava grãos da América Central e Colômbia”, explica Renato Garcia Ribeiro, pesquisador da área de café do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da Esalq/USP.
Ele destaca que a valorização do café em Londres, um benefício para os produtores brasileiros, reflete o aumento geral nos preços da commodity. Desde dezembro, o preço da saca de café robusta subiu 64%, principalmente devido às adversidades climáticas enfrentadas pelo maior produtor, o Vietnã, que enfrenta uma forte seca. Já o café arábica, com a maior produção, teve um aumento de 36%.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC), o Brasil lidera o mercado de arábica, com 40% da produção mundial, especialmente no segmento de cafés especiais.
Em maio, o Brasil alcançou um recorde de exportações de café, conforme relatado pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), com 4,4 milhões de sacas, um aumento de quase 80% em comparação com o mesmo mês do ano anterior.
“Hoje, o mercado mudou significativamente e o Brasil se tornou indispensável, produzindo mais e melhor de maneira sustentável”, afirma Henrique Solter, produtor e exportador da Fazenda Camocim.
Ele lembra que o café brasileiro costumava ser visto como um “filler coffee”, usado para misturas (blends) de torrefadoras. Agora, Solter observa que nos estandes do Brasil e de exportadoras brasileiras em feiras na Coreia do Sul, há filas e ele até dá autógrafos.
Nesse cenário, cafés brasileiros raros são vendidos com prêmios que chegam a quase 8.000%, como o Jacu Bird, produzido na Fazenda Camocim a partir de grãos excretados pela ave endêmica da América do Sul. O café passa por um processo especial de fermentação após a higienização, torra e moagem, conferindo-lhe notas únicas que o posicionam como um produto comparável a vinhos de safra especial.
“A Associação Brasileira de Cafés Especiais (ABCE) desempenha um papel crucial na reconstrução da marca do Brasil no exterior e na recuperação desse mercado”, destaca Solter.
No Brasil, ao contrário de outros setores como o de carne bovina, onde os preços ao consumidor são diretamente afetados pela dinâmica externa, o aumento nos preços do café ainda não se refletiu no varejo, pois a indústria absorveu os aumentos.
“Cerca de 48 milhões de sacas devem ser exportadas este ano, um recorde frente à média de 40 milhões. No entanto, enquanto o preço da saca de café verde subiu 62% desde setembro para a indústria, o preço do pó de café nos supermercados caiu de R$ 32 para R$ 30 em média”, explica Celírio Inácio, diretor executivo da ABIC.
“A dinâmica do varejo não está diretamente relacionada porque não há falta de produto. O que pode acontecer é uma eventual lei da oferta e demanda. Se houver um aumento significativo no consumo, a indústria, que já absorveu parte dos aumentos, poderá repassar esses custos para o consumidor final”, conclui Inácio.