Em 2014, a campanha agressiva de reeleição de Dilma Rousseff criou um personagem para ridicularizar qualquer pessoa que apresentasse prognósticos desfavoráveis à economia brasileira: o Pessimildo. As peças criadas pelo marqueteiro João Santana terminavam com a frase: “chega de pessimismo, pense Dilma”. Tristemente, no início de 2015, após a vitória da presidente, ficou claro que o Pessimildo estava errado. O Brasil se encontrava em uma situação muito pior do que a mais pessimista das previsões do ano anterior, entrando numa espiral de recessão, inflação, déficit público – uma crise sem fim da qual ainda não nos recuperamos. Dilma nem sequer sobreviveu como presidente ao caos que ajudou a criar.
O presidente Lula decidiu intensificar ainda mais as críticas. Agora, os pessimistas foram chamados de “cretinos”, conforme declaração dada hoje no chamado Conselhão, no Palácio do Itamaraty. Sofreram ataques do presidente apenas por falarem algo evidente. Além de toda a questão internacional, que precisa ser considerada, a falta de compromisso do presidente com metas fiscais, reiterada em diversas ocasiões, tem provocado uma série de consequências negativas para a população.
Podemos citar que o Real é uma das moedas com menor desempenho em comparação ao dólar no mundo neste ano; que a instabilidade já afeta a cesta de consumo brasileira, especialmente os alimentos; que o déficit em maio, de R$ 60,9 bilhões, é o pior resultado para o mês nos últimos 27 anos; que a bolsa brasileira já perdeu R$ 43 bilhões em 2024, assim como aumentam o risco Brasil e os juros futuros.
O mercado, em qualquer lugar do mundo, não é exatamente uma instituição política. São agentes muitas vezes anônimos, amorais e pulverizados que, por trás de toda a complexidade das operações, agem de maneira elementar: investem no que pode gerar lucro e retiram o dinheiro quando sentem cheiro de prejuízo – errando e acertando nesse processo. Cada declaração de Lula no sentido de que as nossas contas não precisam ser ajustadas como quer o mercado resulta em busca por outro lugar para investirem seus recursos. E, pior, como país deficitário, o Brasil precisa desesperadamente desse capital desses gestores “maus”.
Curiosa a explicação dos petistas para a conjuntura atual. Invocam os números da inflação e do desemprego além do crescimento econômico de cerca de 3% em 2024 para dizer que está tudo bem e que os críticos (os comentaristas) são contra o país. Ora, no tempo de Dilma, o PIB também havia crescido 3% em 2013, na época das eleições o desemprego estava com as taxas mais baixas da história e a inflação ainda não havia disparado. A preocupação com déficit público apenas se iniciava. Para quem olhava para cima, não em direção ao horizonte, o céu estava azul.
Logo, se analisarmos a fotografia, podemos estar nos conformes. Mas no filme existem riscos futuros porque certas condições pré-caos dilmista se repetem – assim como a mentalidade de alguns de nossos governantes. E, assim como sua ex-pupila política, Lula tenta contornar o problema das contas acreditando no seu carisma e investindo contra os críticos. Em breve, com a substituição do presidente do BC Roberto Campos Neto por alguém à escolha do PT, nem bode expiatório terão além dos comentaristas… Aliás, Roberto Campos tem agido de maneira algo temerária na política, mas é bom lembrar que patrocinou a subida dos juros em 2022, ano eleitoral, prejudicando Jair Bolsonaro. Já pararam para pensar que numa eleição decidida por tão pouco, as ações do BC naquele ano foram mais favoráveis a Lula do que ao então presidente? Já agradeceram ao Roberto Campos?
Enfim, Lula certamente sente uma enorme nostalgia de ter comandado um país que cresceu a uma taxa superior a 7% em 2010, para sua consagração interna e externa. Tudo isso sem ter patrocinado nenhuma reforma importante em seus mandatos, na onda do crescimento que beneficiou praticamente todos os países emergentes produtores de commodities no planeta.
Os tempos atuais são mais duros e há uma parte da população e da classe política que pratica uma oposição quase feroz. Acabou a moleza. Muitas vezes, aqueles comentaristas que alertam sobre os riscos do desequilíbrio das contas fazem apenas seu dever de dizer o que consideram ser fidedigno. Até porque já pagamos na nossa história várias vezes o preço da irresponsabilidade com as finanças públicas e a conta sempre fica mais cara para os verdadeiramente pobres.