Inclusão de possível desaceleração econômica mais acentuada no comunicado da decisão de juros tinha acendido um alerta de leniência, mas BC reforçou os riscos de alta para a inflação
A ata da última reunião do Copom, realizada na quarta-feira (29/01) e que definiu mais uma alta de 1 ponto percentual na taxa Selic, para 13,25%, reforçou o tom duro (“hawk”) do comunicado e tentou afastar leituras de que a diretoria do Banco Central poderia estar ensaiando alguma guinada de moderação. Na opinião de economistas, a mensagem divulgada hoje enfatizou de maneira acertada os riscos de alta para a inflação.
Na semana passada, o Comitê incluiu no balanço de riscos os “impactos sobre o cenário de inflação de uma eventual desaceleração da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a projetada”, o que causou uma apreensão em setores do mercado financeiro sobre uma futura leniência por parte da autoridade monetária.
Para Luis Cezario, economista-chefe da Asset 1, a discussão mais detalhada sobre a avaliação do comitê a respeito da atividade econômica foi exatamente o ponto mais importante da ata divulgada hoje.
“Achei a análise ponderada, e com a preocupação de desfazer a percepção de parte do mercado de que a inclusão do risco de uma desaceleração mais acentuada da atividade como um risco baixista para a inflação seria um sinal de que o Copom estaria preparando uma guinada mais ‘dovish” para a política monetária”, disse.
Mas para Cezario, A ata foi bastante clara no diagnóstico: após um período de dados mais fortes, o comitê passou a ver sinais “incipientes” de desaceleração em setores mais sensíveis ao crédito. “Com a política monetária bastante contracionista, acho que é legítimo que o Copom passe a se preocupar com a intensidade da desaceleração como um risco de baixa para a inflação. Mesmo assim (…), esclareceu que não vê evidências de desaceleração abrupta e que o balanço de riscos para a inflação segue assimétrico para cima”, explicou.
Já a XP disse ter visto o Comitê ainda enfatizando os riscos de alta para a inflação e não aceitando pelo valor de faze os possíveis riscos de baixa. “Isso sugere, em nossa opinião, que o Comitê optará por agir de forma mais agressiva no curto prazo, incluindo continuar a aumentar as taxas além da reunião de março (embora isso não esteja explicitamente dito)”.
A análise é que a comunicação é consistente com o cenário da XP de uma taxa Selic terminal em 15,50%, com aumentos de 100 pontos base, 75 bps e 50 bps nas próximas três reuniões do Copom. “Se, no entanto, o real permanecer estável nos próximos meses e a desaceleração econômica se intensificar, o Copom pode muito bem aumentar sua taxa pela última vez em maio, em vez de junho, como em nosso cenário base”, ponderou.
Rafaela Vitoria, economista-chefe do Inter, por sua vez, avaliou que o Copom deu destaque para a desancoragem das expectativas de inflação e o impacto que pode ter na inflação corrente, o que se mostrou como o principal ponto de desconforto de todos os membros do Comitê. “Além da desancoragem, a economia mais aquecida e a desvalorização do real também compõe um cenário de riscos de pressão inflacionária no curto prazo”, afirmou.
“Na nossa visão, os três pontos tem relação com a forte expansão dos gastos públicos nos últimos dois anos, e a disciplina fiscal a partir de 2025 será fundamental para a convergência mais rápida da inflação para a meta, dando potência para a política monetária, que já está em patamar bastante restritivo mas com efeito limitado devido à expansão fiscal”, completou.
Leonardo Costa, economista do ASA, considerou que a ata buscou um tom mais neutro ao elaborar mais sobre o balanço de riscos para atividade doméstica. “O BC ponderou mais sobre a atividade doméstica, risco que apareceu no comunicado da semana passada. Na ata, o Copom reconhece a resiliência da atividade econômica, impulsionada pelo mercado de trabalho aquecido, política fiscal expansionista e crédito amplo. Apesar de sinais iniciais de desaceleração, há cautela na avaliação, pois oscilações passadas não alteraram a tendência de crescimento”, analisou.
O Itaú também considerou que a Ata do Copom veio um tom mais agressivo do que o comunicado da decisão. “O texto, corretamente, enfatiza a preocupação com a deterioração das expectativas e indica que o Copom está monitorando a atividade econômica em busca de sinais de uma desaceleração mais acentuada, o que não é o seu cenário base (nem o nosso)”, disse o banco.
“Os formuladores da política monetária soam o alarme sobre um potencial aumento da taxa neutra devido a uma política fiscal e parafiscal ainda mais expansionista”, afirmou.
Após a já antecipada alta de mais 1 ponto percentual em março, o Itaú prevê mais dois aumentos da Selic, a um ritmo de 75 pontos-base, para encerrar o ciclo em 15,75% ao ano.
Para Gesner Oliveira, professor da FGV e sócio da GO Associados, há quatro pontos principais a serem considerados na ata. O primeiro é o reconhecimento de que há sinais incipientes de moderação do crescimento. O segundo é o reconhecimento da necessidade de harmonia entre política monetária e política fiscal.
Um terceiro ponto importante, é que há uma projeção de que provavelmente a inflação em 12 meses permanecerá alta no início de 2025 acima dos limites superiores da meta. “E isso ocorrendo por seis meses consecutivos, segundo a nova norma, a um descumprimento da meta. Isso provavelmente ocorreria em junho, conforme registrado na ata”, disse.
“Finalmente, algo que tem preocupado analistas e observadores no mundo inteiro, as incertezas provocadas pela política comercial de Donald Trump, que certamente colocam um fator de incerteza e de instabilidade adicional na conjuntura externa já devidamente. É carregada de vários problemas, tanto geopolíticos quanto problemas do desempenho das economias.”