O impacto da crise na Venezuela tem gerado desconforto e surpresa para Lula, que enfrenta uma pressão sem precedentes. Isso ficou evidente em três ocasiões na segunda-feira, 5.
Primeiramente, o presidente francês Emmanuel Macron fez um telefonema a Lula, pedindo-lhe que intensificasse a contenção ao regime ditatorial venezuelano, que persiste em reprimir adversários e não admite sua derrota nas urnas. Desde a eleição presidencial do dia 28 de julho, a ONG Foro Penal, de Caracas, registrou 1.010 prisões e 23 mortes em apenas sete dias.
Em seguida, foi divulgada uma carta assinada por trinta ex-chefes de Estado e de governo da Espanha e de países latino-americanos. Eles incentivaram Lula a “reafirmar seu compromisso inquestionável com a democracia e a liberdade” e a garantir que esses princípios também prevaleçam na Venezuela.
Lula, que estava em Santiago ao lado do presidente chileno Gabriel Boric, encontrou-se em um cenário delicado. O Chile foi um dos alvos da ditadura venezuelana, que decidiu romper relações com o país governado por Boric e outras sete nações latino-americanas que pediram transparência nos resultados eleitorais. Na mesma segunda-feira, Nicolás Maduro anunciou o “rompimento de relações” com o WhatsApp, sem esclarecer se manteria vínculos com outros aplicativos.
Boric, que tem 40 anos a menos que Lula, é parte de um movimento de renovação da esquerda que rejeita os dogmas da Guerra Fria ainda presentes em alguns segmentos políticos latino-americanos. Em uma reunião em Brasília no ano passado, Boric criticou a postura de Lula, que na época minimizou a gravidade do regime venezuelano. Boric respondeu: “Não é narrativa, é realidade.”
Na segunda-feira, Boric usou seu discurso para mencionar a Venezuela: “O respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados eleitorais. O compromisso com a paz nos leva a promover o diálogo entre governo e oposição.” Ele optou por adiar seus comentários sobre o Brasil até após a visita de Lula.
Lula enfrenta uma situação complexa. Durante as últimas duas décadas, trabalhou para reverter o isolamento da ditadura chavista, buscando reconhecimento regional e impacto na política doméstica. A crise extrema atual, com um regime em colapso e potenciais consequências graves para o Brasil e a América do Sul, pegou-o de surpresa.
Diante das tensões, Lula mostrou otimismo ao citar Pablo Neruda: “Nossas estrelas primordiais são a luta e a esperança, mas não há lutas nem esperanças solitárias.” No entanto, a situação na Venezuela demonstra que esperança sozinha não é uma estratégia eficaz, especialmente na política externa.