Em entrevista à CNN, Pastore disse que o projeto viabiliza uma dinâmica de aumento de salário irrealista
Um dos mais renomados especialistas em relações de trabalho do Brasil, o sociólogo e professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP) José Pastore vê a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que trata das alterações das jornadas de trabalho, desenhada pela deputada Erika Hilton (Psol-SP), como um debate que foi recheado por componentes políticos, mas ignora aspectos econômicos.
Em entrevista à CNN, Pastore disse que o projeto viabiliza uma dinâmica de aumento de salário irrealista.
“Se a jornada fosse reduzida para 36 horas, por exemplo, o aumento de salário seria 18%. Se for como está escrito, o que acho que foi um erro de digitação, o aumento de salário chegaria a 27%. Não tem condição”, afirma ele.
“Vamos analisar o realismo dessa proposta, não adianta falarmos disso filosoficamente, mas sobre os aspectos econômicos”, defende.
“Quem acompanha a dinâmica salarial vê que os aumentos anuais do salário mínimo ficam ao redor de 1% a 2% acima da inflação. São números pequenos, mas realistas do ponto de vista econômico”, diz.
“Do ponto de vista econômico, uma proposta como essa gera inflação, recessão e desemprego. Do ponto de vista político, é fácil angariar assinaturas para essa PEC porque ninguém quer ser contra”, aponta.
“Mas será difícil aprovar este projeto sem levar em conta a situação econômica”, afirma Pastore.
Segundo ele, a comparação com países em que jornadas distintas são adotadas devem levar em consideração a produtividade e divergentes realidades econômicas.
“Existem países que têm jornadas de 38 horas semanais; outros, em que há jornadas de 48 horas. Varia de país para país porque a produtividade do trabalho também varia”, explica.
“Se pegarmos a Suíça como exemplo, em uma hora um trabalhador suíço produz muito mais do que o trabalhador brasileiro, em média”, afirma, defendendo que, mesmo dentro de uma mesma nação, há níveis diferentes de produtividade que variam de setor para setor.
“Se existe uma variação de produtividade que depende de setor, região e outras variáveis, é impossível fazer essa revisão de jornada dessa forma”, afirma ele.
A melhor solução, segundo ele, é permitir que as partes negociem entre si a carga horária — em setor com produtividade alta, negocia-se uma carga menor; o que não seria viável, segundo Pastore, em setores menos produtivos.
Deputada diz que medida não afeta lucro das empresas Autora da PEC, Erika Hilton tem defendido nas redes sociais que, em países em que foi adotada, a redução da jornada “revelou que a receita e o lucro das empresas permaneceram praticamente estáveis” e que “deu certo onde foi aplicada, e representaria um salto em qualidade de vida da população nunca visto em um país em desenvolvimento”.