Em resposta à crescente pressão do mercado financeiro, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou que está preparando um pacote de corte de gastos, sinalizando uma revisão das despesas públicas. Sob a liderança dos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento), a proposta será apresentada ao presidente após o segundo turno das eleições municipais, com a promessa de reduzir entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões. No entanto, especialistas afirmam que as medidas em discussão não atacam a verdadeira origem do desequilíbrio fiscal que assombra o país, o que gera ceticismo sobre a eficácia da iniciativa.
A equipe econômica tem tentado equilibrar as contas por meio de aumentos de arrecadação, como o reajuste de impostos, mas o aumento desenfreado das despesas públicas, aliado à ausência de reformas estruturais, continua minando os esforços. A dívida pública, que já apresenta uma trajetória crescente, ameaça explodir nos próximos anos, especialmente diante do cenário de juros altos. Projeções do Banco Central indicam que a dívida bruta do setor público pode atingir 90% do PIB até 2032, o que representaria um risco ainda maior para a economia brasileira.
Enquanto Haddad tenta acalmar o mercado e Tebet fala em revisão estrutural de gastos, o próprio governo se contradiz ao proteger determinadas áreas de cortes. Entre as medidas ventiladas estão o ajuste dos supersalários do funcionalismo público e mudanças no seguro-desemprego e no abono salarial. No entanto, a resistência do presidente Lula em mexer em pontos centrais, como a política de valorização do salário mínimo, cria obstáculos insuperáveis para um ajuste fiscal profundo.
A insistência de Lula em políticas populistas
Um dos maiores empecilhos para o reequilíbrio das contas públicas é a insistência de Lula em manter políticas que aumentam exponencialmente os gastos da União. A valorização do salário mínimo, indexada a benefícios como as aposentadorias e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), é uma das principais responsáveis pelo rombo nas finanças públicas. Ao vincular o salário mínimo à Previdência, o governo cria uma “bomba-relógio” fiscal, que, segundo o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, pode gerar um gasto adicional de R$ 1,3 trilhão nos próximos 10 anos. Esse montante anula os ganhos da reforma da Previdência aprovada em 2019, um dos poucos avanços recentes nas contas públicas.
Apesar da urgência de uma reforma nessa área, Lula continua a resistir à ideia de desvincular o salário mínimo dos benefícios previdenciários, algo considerado essencial por economistas para controlar o aumento das despesas obrigatórias. A política de valorização do salário mínimo pode até agradar à base eleitoral do PT, mas coloca o país em um caminho insustentável em termos fiscais.
Cortes que atingem trabalhadores, mas não resolvem o problema
Entre as medidas em estudo estão mudanças no seguro-desemprego e no abono salarial, dois benefícios que atingem diretamente os trabalhadores mais vulneráveis. Em vez de focar em cortes que realmente façam diferença nas contas públicas de forma estrutural, o governo parece inclinado a mexer em áreas sensíveis para os trabalhadores, como a redução do seguro-desemprego usando o saldo do FGTS.
Essas medidas, embora possam gerar economia de curto prazo, têm um custo político elevado e podem prejudicar ainda mais a popularidade de Lula, especialmente entre a classe trabalhadora, que sempre foi uma base forte de apoio ao PT. Além disso, o impacto financeiro dessas mudanças é limitado e não resolverá o déficit crescente.
A falta de soluções estruturais e a desconfiança do mercado
Embora o anúncio de corte de gastos seja um passo na direção correta, o mercado continua desconfiado. A manutenção dos pisos constitucionais de saúde e educação e a insistência em políticas de aumento de gastos tornam a tarefa de reequilibrar as contas públicas praticamente impossível sem reformas profundas. Além disso, a equipe econômica já deixou claro que há um limite para o ajuste fiscal que o governo está disposto a implementar.
Com o mercado financeiro reagindo negativamente, a pressão sobre o governo aumenta. A alta do dólar e dos juros futuros reflete a incerteza sobre a capacidade do governo de controlar o crescimento da dívida pública. Se Lula não abrir mão de suas políticas populistas e não permitir uma reforma real nas despesas obrigatórias, o cenário para os próximos anos é sombrio. As contas públicas continuarão a se deteriorar, o que pode gerar uma crise econômica de grandes proporções, comprometendo o futuro do país.
Lula se encontra entre a cruz e a espada: de um lado, a necessidade urgente de ajuste fiscal e, de outro, o compromisso político com sua base eleitoral, que o impede de realizar as reformas necessárias. Sem uma mudança de rumo, o Brasil pode enfrentar um desastre econômico, o que tornaria o governo ainda mais vulnerável politicamente nas próximas eleições.