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‘Moody’s vai rebaixar o Brasil em dois ou três anos’, diz economista em entrevista ao Estadão

Por Alexandre Gomes

O economista Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre), adota uma visão bastante crítica e pessimista sobre o futuro econômico do Brasil e sobre a recente avaliação da agência de classificação de risco Moody’s, que deixou o país a um passo de retomar o grau de investimento. Para Pessôa, a situação fiscal e o crescimento econômico do Brasil não são sustentáveis, e ele prevê que a Moody’s rebaixará a nota de crédito do país dentro de dois ou três anos, revertendo a decisão recente.

Crescimento insustentável e críticas ao governo

Pessôa enxerga desequilíbrios estruturais graves na economia brasileira, que ele acredita estarem sendo ignorados pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Para ele, o atual crescimento econômico é enganoso e insustentável, uma vez que está sendo alimentado por altos gastos públicos em uma economia que já opera em pleno emprego. Esse tipo de crescimento, ele argumenta, inevitavelmente levará a pressões inflacionárias no médio prazo, uma vez que a produtividade do trabalho está crescendo muito menos do que os salários, o que ele vê como um claro sinal de que o governo está “forçando a marcha” da economia.

Essa política, diz Pessôa, pode ser comparada à adotada no governo Geisel, quando o Brasil buscava crescimento econômico a qualquer custo, resultando em problemas estruturais no futuro. Ele vê o governo Lula repetindo erros semelhantes, com uma política econômica “turbinada por gastos públicos” que mascara a realidade econômica de curto prazo, mas que acabará levando a desequilíbrios significativos mais à frente.

Problemas com a produtividade e o setor privado

Outro ponto crucial da crítica de Pessôa ao governo é a desaceleração da produtividade, que ele afirma não estar acompanhando o aumento dos salários. Esse descompasso entre produtividade e remuneração, alerta ele, é um dos sinais mais claros de uma trajetória insustentável. Pessôa também destaca que a rentabilidade das empresas brasileiras está em queda, o que, segundo ele, é mais um indício de que o atual modelo de crescimento não pode ser mantido. A queda nas exportações líquidas em relação ao PIB também é mencionada como um fator que reflete a perda de competitividade da economia brasileira.

Para o economista, esse cenário aponta para a necessidade de um ajuste econômico inevitável no futuro, caso o governo continue no caminho atual. Ele sugere que, embora o governo Lula possa continuar adiando esse ajuste até as próximas eleições em 2026, a economia acabará enfrentando um colapso semelhante ao que ocorreu no segundo mandato de Dilma Rousseff.

Dívida pública crescente

Pessôa é particularmente incisivo ao tratar da dívida pública brasileira, que ele vê como insustentável. Ele e sua equipe projetam que a dívida pública pode atingir 86% do PIB até 2026, sem qualquer sinal de estabilização. A trajetória de endividamento é vista por ele como um dos principais fatores que levarão a uma crise fiscal mais adiante. Segundo Pessôa, o aumento da dívida pública nos próximos anos – projetado em 14 pontos percentuais do PIB durante o atual mandato de Lula – torna impossível qualquer reversão dessa tendência sem reformas estruturais significativas, as quais ele não vê sendo implementadas.

Comparação com o governo Dilma

Pessôa traça um paralelo entre o que ele considera um “desarranjo” econômico atual e o que ocorreu no governo de Dilma Rousseff. Ele afirma que, embora o cenário de 2027 provavelmente seja similar ao de 2015, quando o Brasil entrou em uma grave recessão, a intensidade da crise será menor desta vez. Ele explica que, no governo Dilma, os desequilíbrios econômicos se acumularam por um período muito maior, desde 2007, enquanto agora o ciclo de desarrumação econômica seria mais curto. No entanto, ele deixa claro que isso não elimina a necessidade de um ajuste drástico na economia.

Um dos fatores que Pessôa acredita ter prolongado o colapso no governo Dilma foi o “boom” das commodities, que ocultou os problemas estruturais até que fosse tarde demais. No entanto, ele destaca que, desta vez, o cenário internacional não está tão favorável para o Brasil, o que encurtará o prazo para que os desequilíbrios atuais venham à tona.

Lula

Embora reconheça que Lula é um político pragmático, Pessôa argumenta que o presidente tornou-se menos flexível em sua abordagem econômica e mais inclinado a adotar políticas heterodoxas. Segundo ele, Lula parece convencido de que o aumento dos gastos públicos é uma forma eficaz de estimular o crescimento econômico, ignorando os riscos inflacionários e de endividamento. Ele sugere que o presidente foi influenciado por uma visão ultrapassada, onde “gasto é vida”, ignorando evidências contrárias que mostram como políticas fiscais irresponsáveis podem gerar crises no longo prazo.

Pessôa acredita que Lula, ao contrário de Dilma Rousseff, pode ter maior habilidade política para conduzir ajustes em seu possível quarto mandato, mas ele ainda vê com ceticismo a capacidade do governo atual de lidar com os problemas econômicos que estão se acumulando.

Futuro distante do grau de investimento

Sobre a possibilidade de o Brasil reconquistar o grau de investimento, Pessôa é categórico ao afirmar que o país está “superdistante” dessa meta. Ele acredita que a Moody’s, em vez de promover o Brasil, deverá rebaixar a nota nos próximos anos, diante do acúmulo de desequilíbrios econômicos e fiscais. Para ele, as decisões recentes da agência de classificação de risco foram baseadas em uma leitura excessivamente otimista do desempenho econômico e do novo arcabouço fiscal proposto pelo governo, que, segundo ele, não resolve os problemas estruturais do país.

Em resumo, Pessôa vê um futuro de dificuldades para a economia brasileira, com riscos crescentes de inflação, endividamento e queda na competitividade. Ele sugere que, a menos que o governo Lula mude sua abordagem de maneira significativa, o Brasil enfrentará um ajuste econômico doloroso, que será necessário para corrigir os erros que estão sendo cometidos agora.

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