O governo Lula (PT) estuda promover mudanças no Simples Nacional, regime especial de tributação para micro e pequenas empresas, como parte de uma série de medidas para reequilibrar as contas públicas. A proposta, conduzida pelo Ministério do Planejamento, liderado por Simone Tebet, reacende debates sobre a eficácia e distorções do regime, amplamente defendido por setores empresariais e duramente criticado por órgãos governamentais, como a Receita Federal.
Tebet defende a necessidade de “aprimorar” o Simples, reduzir distorções e gerar mais receita para o governo. Segundo ela, o regime foi “ampliado em demasia”, incluindo profissionais liberais e empresas que se beneficiam de vantagens fiscais indevidas. A ideia do governo é que essas revisões possam trazer maior “justiça tributária” e ampliar a arrecadação, sem eliminar completamente o benefício.
No entanto, as críticas à proposta não tardaram a surgir. Para muitos analistas e representantes do setor, a tentativa de rever o Simples Nacional pode ter efeitos prejudiciais sobre pequenas empresas e empreendedores individuais, que são responsáveis por uma parcela significativa da criação de empregos formais no Brasil. Além disso, a inclusão do Simples como “renúncia fiscal” no Demonstrativo de Gastos Tributários, elaborado pela Receita, é vista como um erro conceitual por especialistas.
Críticas ao tratamento do Simples como “renúncia fiscal”
Muitos críticos da medida destacam que o Simples Nacional não deveria ser tratado como uma “renúncia fiscal”. O professor Ricardo Castagna, da Faculdade Belavista, argumenta que o regime é constitucionalmente garantido e foi criado para simplificar a vida de micro e pequenas empresas, que enfrentam um ambiente tributário hostil. Ao incluir o Simples no cálculo de renúncia fiscal, o governo distorce o entendimento do regime, tratando-o como um “benefício”, quando na verdade é um alicerce da formalização de negócios no país.
Essa visão é reforçada por setores empresariais e pelo Ministério do Empreendedorismo, que defende o Simples como um dos pilares da formalização e do crescimento das pequenas empresas. O ministério também argumenta que o impacto fiscal do regime é amplamente compensado pela geração de empregos formais e pela diminuição da informalidade, fatores essenciais para a economia brasileira.
Impacto sobre as pequenas empresas
Uma das principais preocupações com as mudanças no Simples é o impacto que elas podem ter sobre as pequenas empresas. Atualmente, o regime permite que empresas com faturamento de até R$ 4,8 milhões se beneficiem de alíquotas reduzidas e simplificação no pagamento de tributos. O governo aponta que esse teto é alto demais, citando que empresas maiores acabam se beneficiando indevidamente, especialmente por meio da prática de “pejotização” e da abertura de múltiplos CNPJs para diluir faturamentos e evitar o desenquadramento.
Por outro lado, para pequenas empresas, o Simples é visto como um meio essencial de sobrevivência. Joelson Sampaio, professor de economia da FGV, alerta que o alto custo tributário no Brasil inviabilizaria muitos negócios se não houvesse o Simples. Ele reconhece que há espaço para melhorias, mas destaca que a revisão deve ser cuidadosa para não comprometer o papel fundamental do regime.
Perigo de enfraquecer o Simples Nacional
O relatório de 2017 do Banco Mundial, que classifica o Simples como “caro e distorcido”, serve de apoio para o governo em sua tentativa de revisão. O documento argumenta que o regime incentiva empresas a permanecerem pequenas para se manterem no Simples, o que prejudica a competitividade e o crescimento de médio porte. No entanto, é preciso ponderar que essa análise não leva em conta as peculiaridades do mercado brasileiro, onde a carga tributária e burocrática são consideradas barreiras significativas para empresas menores.
O Ministério do Empreendedorismo defende que o Simples é crucial para reduzir a informalidade e permitir que pequenos negócios prosperem em um ambiente tributário complicado. Alterações que enfraqueçam o regime podem resultar em uma maior informalidade e em um aumento nas taxas de mortalidade de empresas, justamente o oposto do que o governo deseja alcançar com a medida.
A proposta de revisão do Simples Nacional deve ser vista com cautela. Enquanto o governo busca novas fontes de arrecadação, é fundamental que o debate inclua todos os atores envolvidos para que o regime continue cumprindo sua função de apoio à micro e pequenas empresas. Se mal conduzida, a reforma pode prejudicar setores que já enfrentam desafios para se manterem no mercado, além de aumentar o desemprego e a informalidade, com consequências desastrosas para a economia do país.