Considerando os créditos extraordinários liberados pelo governo para combater as chuvas no Rio Grande do Sul e os incêndios na Amazônia e no Pantanal, o governo federal deverá gastar cerca de R$ 28 bilhões fora do limite fiscal este ano, destinados ao enfrentamento dos chamados “eventos extremos”.
Esse valor inclui R$ 27,4 bilhões autorizados para lidar com a calamidade no Rio Grande do Sul, conforme registrado no mais recente Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas, e mais R$ 514 milhões previstos em uma medida provisória enviada ao Congresso pelo Executivo para combater os incêndios.
De acordo com as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal, os créditos extraordinários não afetam os limites de despesa do arcabouço fiscal, que restringem o crescimento dos gastos a 70% do aumento das receitas ou a 2,5% em relação ao valor gasto no ano anterior.
A novidade é que, nas duas tragédias, foram encontradas formas de evitar que esses gastos afetem também as metas de resultado primário. No caso do Rio Grande do Sul, essa possibilidade foi garantida por decreto legislativo; para os incêndios, por uma decisão do ministro do Supremo, Flávio Dino.
Economistas consultados pela CNN destacam que essas soluções foram necessárias devido às dificuldades do governo em alcançar a meta de resultado primário para 2024, que prevê déficit zero.
Murilo Viana, economista da GO Associados, lembra que, pelas regras do arcabouço fiscal, “o não cumprimento da meta de resultado primário em 2024 resultaria em uma redução no espaço para despesas primárias em 2026, um ano eleitoral.”
Felipe Salto, economista-chefe da Warren, sugere que, diante da crescente frequência de eventos climáticos extremos no Brasil e no mundo, seria recomendável que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) já previssem recursos para essa finalidade.
“A vantagem seria um maior controle fiscal. Por exemplo, em vez de destinar uma reserva de contingência para emendas parlamentares, que não têm urgência, seria mais adequado alocar parte desse orçamento para combater desastres climáticos”, afirma Salto.
Viana também observa que o arcabouço fiscal já prevê uma margem de tolerância de 0,25 ponto percentual em relação à meta de resultado primário. “Mas essa margem, que deveria servir para amortecer choques, já está sendo utilizada pelo governo para cobrir o déficit fiscal”, comenta.
Salto ressalta que, desde o governo de Michel Temer (2016-2018), houve avanços na institucionalização do uso de créditos extraordinários. A previsão de resultado primário da Warren é de um déficit de R$ 57,6 bilhões.