O bloqueio dos bens da Starlink determinado nesta quinta-feira, 29, pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), como forma de saldar as dívidas do X (antigo Twitter), gerou um grande debate no meio jurídico. Especialistas ouvidos pelo Estadão afirmam que é incomum responsabilizar uma empresa pelo débito de outra, mesmo quando pertencem ao mesmo proprietário, sem comprovar fraude.
O ministro Moraes ordenou o congelamento das contas da Starlink com base na alegação de que ambas as empresas, X e Starlink, fazem parte de um “grupo econômico de fato” sob o comando de Elon Musk. O objetivo declarado é utilizar o confisco para quitar as pendências financeiras da rede social com a Justiça brasileira. No entanto, a X pertence à X Holdings Corp, enquanto a Starlink é vinculada à Space Exploration Technologies Corp, conhecida como SpaceX. A Starlink possui atualmente 215 mil clientes no Brasil, incluindo instituições como Forças Armadas e escolas públicas.
Embora Musk seja o principal acionista das duas empresas, ele atua como CEO apenas da SpaceX, enquanto a X Corp é liderada por Linda Yaccarino, com Musk atuando como presidente do conselho.
A professora Eliana Franco Neme, especialista em direito constitucional, observa que a desconsideração da personalidade jurídica — quando os bens de uma empresa são usados para cobrir dívidas de outra — é uma medida excepcional e requer evidências de fraude ou confusão patrimonial.
O professor Flávio Luiz Yarshell, da USP, destaca que a extensão de responsabilidade de uma empresa para outra é rara e só deve ocorrer com evidências claras de fraude. Ele ressalta que qualquer decisão desse tipo deve ser cuidadosamente justificada.
O doutor em Direito Econômico Emanuel Pessoa aponta que, na prática, a desconsideração da personalidade jurídica deve seguir procedimentos formais, como a emissão de uma carta rogatória para a cooperação internacional, o que poderia levar mais tempo. Ele sugere que o bloqueio pode ter sido motivado pela possibilidade de a Starlink ter receitas no Brasil, mas observa que o método usado por Moraes poderia ter sido mais adequado.
Andre Marsiglia, advogado constitucionalista, critica a decisão de Moraes por não seguir os procedimentos processuais apropriados, o que pode colocar o Brasil em um “mapa de risco” para investidores estrangeiros. A decisão, segundo ele, fere a livre iniciativa e pode desestimular investimentos internacionais.
Após o bloqueio, Musk comentou que o Brasil agora é visto como um “país ditatorial” e que não é mais seguro para investidores. A Starlink, que atende 215 mil clientes no Brasil, incluindo órgãos governamentais, afirmou que continuará oferecendo seus serviços, possivelmente “gratuitamente”, diante das dificuldades para cobrar as faturas.