Se a resposta do Ministério das Relações Exteriores brasileiro à eleição questionável na Venezuela foi lenta e moderada, pelo menos buscou um tom de crítica. Já a reação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi marcada por um cinismo desavergonhado e um acentuado tom de cumplicidade.
Em entrevista, Lula minimizou o problema: “Não tem nada de grave, não tem nada de assustador. Não tem nada de anormal. Teve uma eleição. Teve uma pessoa que disse que tem 51%, teve outra pessoa que teve 40 e pouco por cento. Um concorda, o outro não, entra na Justiça, e a Justiça faz.”
Essa lógica tortuosa ecoa sua infame declaração do ano passado sobre a Guerra da Ucrânia, em que comparou a Rússia invasora e o país invadido, alegando que “quando um não quer, dois não brigam”.
Mais uma vez, o presidente parece descartar qualquer escrúpulo ao defender regimes tirânicos associados a aliados seus, como Vladimir Putin e Nicolás Maduro. Para ele, não há nada de anormal em uma eleição organizada por um órgão que sistematicamente excluiu candidaturas de oposição, cancelou convites para observadores da União Europeia e prendeu dezenas de críticos do regime durante a campanha.
Nada é considerado fora do normal para Lula, mesmo com a opacidade na divulgação dos resultados, que contradisse as pesquisas de intenção de voto e demorou mais de seis horas para fornecer informações sobre as urnas.
O presidente sugere que os descontentes devem recorrer à Justiça, em um país onde até o Parlamento teve seus poderes anulados após uma vitória da oposição em uma eleição legislativa sete anos atrás.
Enquanto Lula afirmava a normalidade da eleição, considerada “pacífica, democrática e soberana” por seu partido, Caracas e outras cidades venezuelanas eram palco de protestos que resultaram em pelo menos 11 mortes e centenas de prisões.
A Organização dos Estados Americanos (OEA) não reconheceu a reeleição de Maduro, citando indícios de manipulação dos resultados. Governos de esquerda, como os do Chile e da Colômbia, também expressaram dúvidas sobre a integridade do pleito.
Fora dos holofotes, Lula conversou com o presidente dos EUA, Joe Biden, e, segundo a Casa Branca, concordou com a necessidade de uma divulgação completa e imediata dos dados eleitorais da Venezuela.
Essa posição inicial do Itamaraty representa o caminho mais honroso a ser seguido pelo Brasil. Infelizmente, o descaramento de Maduro e a postura acomodada do presidente brasileiro parecem garantir mais vergonha para o país.