A medida provisória editada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para compensar a desoneração da folha de pagamento está gerando reações de setores da economia, que preveem impacto na produção e, consequentemente, nos preços de alimentos, combustíveis, medicamentos e outros itens. A proposta foi apelidada de “MP do Fim do Mundo”.
Essa medida, que limita a compensação de créditos de PIS e Cofins, visa equilibrar o orçamento diante da manutenção da desoneração da folha para 17 setores da economia e para municípios. Segundo o Ministério da Fazenda, a MP pode gerar até R$ 29,2 bilhões neste ano, compensando as perdas na arrecadação estimadas em R$ 26,3 bilhões devido à desoneração.
A medida provisória é uma forma de compensação e equilíbrio das contas públicas, conforme exige a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que determina que renúncias de receita sejam acompanhadas de uma fonte de compensação.
No entanto, a medida não foi bem recebida. Representantes da indústria, do comércio, do agronegócio, de distribuidoras de combustíveis e dos setores de saúde criticaram a proposta. Conforme reportado pelo Metrópoles, o Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás (IBP) estima um aumento no preço da gasolina entre R$ 0,20 e R$ 0,36, e entre R$ 0,10 e R$ 0,23 no preço do diesel.
Entidades da indústria farmacêutica criticaram a decisão do governo de revogar o ressarcimento em dinheiro de créditos presumidos do PIS e Cofins sobre a venda de produtos. “Para produzir medicamentos, dispositivos médicos e equipamentos, que são desonerados do PIS e da Cofins, a indústria da saúde incorre em custos na compra de insumos que são adquiridos com o ônus desses tributos”, explicou uma nota assinada por 30 entidades do setor.
Luciano Nakabashi, professor do Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP/USP), explica que os setores mais afetados serão aqueles com maior volume de créditos a compensar, como o agronegócio e a indústria farmacêutica. Contudo, o impacto será sentido mais diretamente no caixa das empresas do que no bolso do consumidor. “Num primeiro momento, a tendência é afetar mais o caixa das empresas do que o preço para o consumidor. Claro, vai depender de setor para setor. No caso do setor agroexportador, o preço é determinado pelo mercado internacional, então quem acaba absorvendo o impacto, principalmente, é o produtor ou os agentes envolvidos na cadeia produtiva”, ressalta.
Parlamentares e especialistas endossam críticas
A medida do governo federal também recebeu críticas de parlamentares. Um grupo de 23 congressistas manifestou preocupação com as “graves consequências” que a alternativa apresentada pode causar na economia.
A medida provisória ganha força de lei assim que é publicada, mas precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional em até 120 dias para se tornar uma lei definitiva. Portanto, a proposta pode enfrentar dificuldades nas Casas Legislativas.
Nesta segunda-feira (10/6), o diretório nacional do Progressistas (PP) apresentou uma ação direta de inconstitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal contra a MP, que terá o ministro Gilmar Mendes como relator e inclui um pedido de decisão urgente.
César Bergo, economista e professor de mercado financeiro da Universidade de Brasília (UnB), destaca que a medida provisória poderá trazer insegurança jurídica para a gestão financeira do setor produtivo e comercial. “Não resta dúvida de que, geralmente, quem paga imposto é o consumidor, então as empresas irão repassar esse aumento de impostos aos preços. O governo tem essa visão de necessidade de arrecadação devido à perda com a desoneração, mas não é uma medida eficaz, pois isso pode reduzir a produção, diminuir a atividade econômica e resultar em menor arrecadação para o governo”, enfatiza César Bergo.
Guilherme Di Ferreira, advogado tributarista e diretor-adjunto da comissão de direito tributário da OAB Goiás, acredita que a MP burocratiza e dificulta a utilização de benefícios fiscais e a compensação de créditos pelas empresas. Segundo ele, além do impacto sobre os preços, a medida pode gerar demissões. “A partir do momento em que as empresas não conseguirem utilizar os benefícios fiscais ou tiverem limitada a compensação de tributos, o impacto será repassado ao consumidor final, resultando no aumento dos preços dos produtos ou em cortes de gastos, incluindo possíveis demissões”, pontua.
Governo tenta minimizar impacto
Apesar das críticas, o governo nega que a medida terá impacto sobre a inflação. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mesmo com as mudanças propostas pela MP, a devolução dos créditos para as empresas “continua garantida”. “Como operar a devolução do crédito de exportação de PIS/Cofins? Isso está pacificado e muito bem encaminhado no âmbito da reforma tributária. Vamos procurar aderir essa MP ao que já foi pactuado no Congresso Nacional sobre esse tema na regulamentação da emenda constitucional”, explicou Haddad.
Nesta segunda-feira (10/6), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se reuniu com o ministro da Fazenda e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para discutir o assunto.