Uma multidão se aglomera nos degraus de um pequeno mercado estatal nos arredores de Santiago, a segunda maior cidade de Cuba, suando e gritando, lutando por uma chance de obter uma ração mensal de frango.
Por uma pechincha de 20 pesos – cerca de um níquel à taxa de câmbio do mercado negro – um saco de coxas atrai a multidão, mas o frenesi se transforma em caos quando se espalha a notícia de que pode não haver o suficiente para todos.
E é então que as luzes se apagam.
“Esta é a vida aqui”, disse Mauri Macias, um chef de 39 anos com dois filhos, enquanto esperava na fila para comprar frango subsidiado pelo governo. “Você vive sem poder fazer planos.”
O incidente da última quarta-feira em Santiago – palco de um raro protesto público no início deste mês – oferece um vislumbre revelador do desafio que o governo cubano enfrenta: quando a energia falha, as tensões – mesmo em áreas leais à Revolução Comunista de Fidel Castro de 1959 – começam a se intensificar.
A Reuters conversou com mais de duas dezenas de moradores e autoridades locais nos bairros de Veguita del Galo, José Marti, Micro 9 e Abel Santamaria, em Santiago de Cuba. Eles expressaram frustração com a escassez de alimentos e os cortes de energia que às vezes chegam a ultrapassar 10 horas por dia.
“Viver sem eletricidade é primitivo”, disse Yoni Mena, 34 anos, que vende legumes em Abel Santamaria. “Os mosquitos, o calor, às vezes não há água. As pessoas estão enlouquecendo. E isso leva a outros problemas, como a violência.”
Centenas de manifestantes se reuniram em 17 de março no Parque Carretera del Morro, em Santiago, clamando por “poder e comida”, segundo relatos de residentes locais. Vídeos nas redes sociais mostraram um grupo menor exigindo “liberdade” enquanto a líder local do Partido Comunista, Beatriz Johnson, se preparava para falar com a multidão do telhado.
Tanto o governo quanto observadores caracterizaram os protestos como em grande parte pacíficos.
O governo cubano, antes relutante em reconhecer os protestos, agora apela ao diálogo e agiu rapidamente para atender às queixas nas áreas onde surgiram.
Em Santiago de Cuba, as autoridades locais e os residentes disseram que o governo começou a distribuir rações subsidiadas, incluindo frango, arroz, açúcar e leite.
O fornecimento de energia também se tornou muito mais regular na semana após os protestos, de acordo com moradores e observações da Reuters.
“Estamos cientes de que a falta de eletricidade pode ser a faísca para qualquer protesto”, disse o ministro de Energia e Minas, Vicente de la O’Levy, na semana passada.
O presidente cubano, Miguel Diaz-Canel, visitou Santiago na quinta-feira. Ele culpa os Estados Unidos e a “mídia capitalista” por alimentar os protestos e diz que seu governo está disposto a dialogar com os cidadãos insatisfeitos.
A Reuters, que não testemunhou nenhum protesto enquanto estava em Santiago nos dias seguintes aos comícios de 17 de março, solicitou uma entrevista com líderes do Partido Comunista para discutir os protestos anteriores, mas não obteve resposta.