O ex-ministro dos governos Lula e Dilma Rousseff, Aldo Rebelo, licenciado do PDT, assumiu em fevereiro a Secretaria de Relações Internacionais de São Paulo, substituindo a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) na gestão de Ricardo Nunes (MDB). Distanciado de seus antigos aliados, Rebelo até elogia as tentativas de Lula de se aproximar do alto comando das FFAA, mas identifica mais falhas do que acertos no terceiro mandato do petista. Em uma entrevista ao GLOBO em seu gabinete, Rebelo critica a postura agressiva do governo em relação ao agronegócio, repreende a polarização com Bolsonaro e classifica as investigações contra o ex-presidente como “perseguição”.
Pergunta: O governo Lula tem mais acertos ou mais erros?
Resposta: Muito mais erros. Não percebo no presidente Lula uma preocupação atual com as diversas forças. Parece haver um conflito constante com seu principal adversário, o ex-presidente Jair Bolsonaro. Também vejo uma postura agressiva do governo em relação ao setor do agronegócio. Lula realiza menos reuniões políticas do que a presidente Dilma, que já tinha aversão a esses encontros. Ele parece ter pouca paciência para a política. Não tolera críticas, o que dificulta a eficácia política.
Pergunta: O que achou da decisão de suspender as cerimônias em memória ao golpe de 64?
Resposta: Absolutamente correta. O Brasil precisa usar o passado para unir o país, não para dividi-lo.
Pergunta: Lula tem acertado na relação com os militares?
Resposta: Ele acertou na escolha do ministro da Defesa (José Múcio), que possui habilidades diplomáticas e de conciliação. Múcio se esforça bastante, e o presidente é pressionado a adotar uma postura mais conciliatória em relação aos militares. Entretanto, ele também enfrenta pressões para adotar uma agenda de revanchismo.
Pergunta: Pressão do PT?
Resposta: Não de todo o PT. Alguns setores compreendem que as Forças Armadas não são o problema, mas sim parte da solução. No entanto, há membros do PT que ainda vivem na agenda de 64. Lula tenta equilibrar essas perspectivas.
Pergunta: O que está por trás da queda na popularidade de Lula?
Resposta: Não é simplesmente a economia. Embora os indicadores econômicos não sejam tão negativos, o país enfrenta um mal-estar existencial e espiritual. Apesar dos sucessos, as pessoas perderam a confiança no futuro. Isso reflete-se negativamente no governo e no presidente. Lula perdeu a capacidade de inspirar esperança.
Pergunta: Por quê?
Resposta: O Brasil reduziu tudo à disputa pelo poder imediato. Não está preocupado com uma agenda de futuro que traga esperança. Lula priorizou a luta pelo poder em detrimento da construção de um futuro melhor. Ele está mais focado em suas próprias amarguras, o que é insuficiente para governar.
Pergunta: Como avalia a política externa do governo Lula?
Resposta: É mais uma política externa ornamental do que substancial. Embora possa parecer esteticamente agradável, não está à altura dos desafios do Brasil. A mediação é uma vocação do Brasil, especialmente na América do Sul. Devemos estabelecer relações com base em interesses comuns, não em ideologias.
Pergunta: Há elementos para condenar Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado?
Resposta: Politicamente, não vejo isso. Os golpes de Estado envolvem conspirações complexas, ao contrário do que é atribuído a Bolsonaro. O presidente foi aos Estados Unidos e nada aconteceu. Quanto à perseguição ao ex-presidente, não tenho dúvidas. São os mesmos atores que agiram contra Lula.
Pergunta: Como está sua relação com Bolsonaro?
Resposta: Boa, como sempre foi. Nunca tive problemas com ele. Trocamos mensagens ocasionalmente.
Pergunta: Considera Bolsonaro um amigo?
Resposta: Tenho apreço por ele. Convivemos amigavelmente por décadas, mesmo com opiniões divergentes em alguns temas.
Pergunta: Há chances de deixar o PDT?
Resposta: Não e não vejo motivos para deixar o partido nesse momento. Minha filiação partidária está consolidada e alinhada com meus princípios políticos.
Pergunta: Qual é sua opinião sobre a figura política de Tabata Amaral?
Resposta:
Tenho respeito pela trajetória pessoal dela, mas discordo da ênfase excessiva em pautas identitárias em detrimento de questões mais urgentes e relevantes para a cidade de São Paulo.
Pergunta: Por que optou por apoiar Nunes em vez de Boulos?
Resposta: Vim para contribuir na derrota do esquema que ameaça a administração da prefeitura de São Paulo. Acredito que Boulos não representa uma opção viável para a cidade, dadas suas propostas e abordagens.
Pergunta: Como interpreta a relação entre Nunes e Bolsonaro?
Resposta: É uma parte inevitável da política. A formação de alianças heterogêneas é comum nesse ambiente, visando fortalecer as chances de sucesso eleitoral. Quem está isolado politicamente está mais vulnerável.
Pergunta: Qual é sua visão em relação à possibilidade de ser o vice de Nunes?
Resposta: Nao é minha pretensão ser vice. É uma questão que deve ser discutida entre os partidos e o próprio prefeito. Não considero apropriado especular sobre isso agora, dada a complexidade das negociações políticas em curso.
Pergunta: E quanto ao apoio do PT a Boulos?
Resposta: Acho completamente incoerente. Particularmente, tenho uma história de apoio e colaboração com o PT, inclusive em momentos desafiadores. A escolha de um vice que votou pelo impeachment da Dilma e tem ligação com o PMDB parece contraditória com os ideais do partido.